Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC32.1 - Saúde mental de crianças /adolescentes

45000 - COMO FURAR BARREIRAS DE ACESSO À REDE FORMAL DE ENSINO? UMA CARTOGRAFIA DA REDE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL INFANTO-JUVENIL DE NITEROI-RJ
SOLANNE GONÇALVES ALVES - EICOS/UFRJ, MARIANE FERREIRA DOS SANTOS ARAÚJO - UFRJ/FESAÚDE, DANIEL NORO DE LIMA - FESAÚDE, MARIA PAULA CERQUEIRA GOMES - EICOS/UFRJ


Apresentação/Introdução
Este relato faz parte do percurso de uma pesquisa cartográfica, que objetivou acompanhar processos de cuidado da Rede de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil (RAPS) do município de Niterói, durante os meses de outubro/2022 a abril/2023.

Objetivos
O objetivo este relato é compartilhar o conhecimento concatenado durante o processo cartográfico, promovendo reflexões que evidenciem caminhos para o engendramento e fortalecimento de ações e políticas que garantam os direitos dos (as) adolescentes vulnerabilizados (as).

Metodologia
Para tanto, foi utilizado a ferramenta metodológica do usuário-guia. O usuário-guia é aquele que direciona o(a) pesquisador(a), por meio de suas conexões existenciais, pelas linhas da rede de garantia de direitos, seguindo a produção de cuidado pelas equipes do Centro de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil (CAPSi) e Unidade de Acolhimento Infanto-Juvenil (UAI).

Resultados e discussão
A UAI é um serviço de caráter residencial, voluntário e transitório, direcionado a adolescentes em uso prejudicial de drogas, rompimento de vínculos familiares e risco no território, cujas estratégias de cuidados são baseadas na lógica da criação de vínculo e do acolhimento, da baixa exigência da redução de danos e do cuidado no território, visando a desinstitucionalização. Selecionamos, neste relato de experiência, a produção de barreira de acesso à rede formal de ensino ao usuário-guia. As experiências e percursos acompanhados durante a pesquisa nos fez interrogar quais processos de produção de barreiras são operados nas redes intersetoriais. Quais razões/dimensões estão em jogo para que o Conselho Tutelar não consiga garantir a matrícula escolar de adolescentes, que se encontram acompanhados pelos serviços de alta complexidade, da rede atenção psicossocial infanto-juvenil? Observamos que, embora exista situações em que o usuário-guia tenha manifestado o desejo em estudar, inclusive tentando por si próprio, exigências protocolares advindas também dos órgãos da educação se materializam enquanto barreiras de acesso e consequentemente vão postergando o seu ingresso na rede educacional tendo como efeito o abandono. Essas exigências e protocolos rígidos comprometem os objetivos da UAI em prevenir o agravamento de situações de negligência, violência e rupturas de vínculos, além de fragilizar a convivência comunitária e o fortalecimento da autonomia. Ademais, a vida desses adolescentes que passam a ser acompanhados por um dispositivo como a UAI são marcadas por violências, considerando as adversidades subjetivas e estruturais, cujo cuidado em rede precisa estar pautado no conceito da equidade, em que a norma protocolar precisa ser (re) avaliada a cada caso, a fim de garantir seus direitos, já violados. O setor saúde, sozinho, não é capaz de cuidar dessas demandas que são intersetoriais. Considerando a saúde como afirmação da vida, o acesso ao serviço escolar é uma produção de vida, cuja barreira, além de física-geográfica, torna-se existencial. Percebemos, nos atendimentos compartilhados com o Conselho tutelar, que as análises das relações familiares, relações com o território e vulnerabilidades do usuário-guia, definiram um posicionamento moralizador que dificultou o acesso à escola, pois nesta “pesquisa social” feita pelo CT tiveram algumas exigências que o usuário-guia ou a família não conseguiram cumprir. Esta diferença de pontos de vista e níveis de exigência dos diferentes setores envolvidos na garantia de direitos desta população infantojuvenil carregada de estigmas indica a necessidade de que o setor Saúde assuma uma interlocução ativa, facilitando a ordenação da rede de cuidados.

Conclusões/Considerações finais
Nesta direção, esta pesquisa cartográfica ajudou a produzir deslocamentos às naturalizações do cotidiano do trabalho e as invisibilidades das barreiras de acesso que são operadas nas redes intersetoriais. A dimensão temporal se fez presente com toda a sua força. Ou seja, o tempo próprio, particular, em que os serviços de saúde, educação e assistência social operam, se dá em total descompasso com o inadiável compromisso ético de garantir os direitos dos (as) adolescentes. É inadiável trazer para a cena pública a necessidade urgente de se intensificar e ampliar o trabalho colaborativo e compartilhado entre as diversas redes territoriais.