02/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC9.1 - Racismo, formação e saúde I |
46695 - DESCOLONIZANDO CURRÍCULOS DAS GRADUAÇÕES EM SAÚDE: INTERSECCIONANDO RAÇA E GÊNERO CAMILLE CORREIA SANTOS - IMS-UERJ
Apresentação/Introdução A invisibilidade das questões étnico-raciais nos currículos acadêmicos tem sido evidenciada, entretanto, é preciso aprofundar como o gênero atua interseccionado à opressão da questão racial. Podemos questionar e compreender que a universidade ocidentalizada ainda é um espaço em que homens e mulheres brancas, como corpos/sujeitos universais, são as grandes referências nos currículos acadêmicos, além de ainda continuarem ocupando este espaço de forma majoritária. Pauta-se a necessidade de construir currículos em que o racismo e o sexismo, nos determinantes sociais em saúde, Sejam encarados como fatores estruturais produtores da hierarquização social associada à vulnerabilidades em saúde. Este ensaio tem como referencias teóricas os estudos do feminismo negro, que tem sistematizado categorias e conceitos que auxiliam analiticamente as estruturas eurocêntricas na formação.
Objetivos O objetivo deste ensaio é refletir sobre a presença/ausência de referências/conteúdos que interseccionam raça e gênero nos currículos dos cursos de graduação em saúde.
Metodologia Faz parte do projeto que está em desenvolvimento no programa de doutorado, com abordagem qualitativa. Os cursos da graduação em saúde que estão em foco no estudo são: Nutrição, Enfermagem, Medicina, Odontologia e Psicologia. Adotou-se a escrita em formato de ensaio neste trabalho, no qual, realizou-se uma análise e diálogo critico com as referências bibliográficas.
Resultados e discussão Em análise preliminar à pesquisa sobre desconstrução do sexismo e raça nos currículos em saúde, nota-se que tem crescido o número de estudos sobre gênero e saúde, mas sendo a maioria abordada de forma genérica, às vezes como disciplina eletiva ou optativa, ademais ínfimos quando intersecciona raça e gênero. Cabe ressaltar, dentre os estudos encontrados, os que apresentam reflexões teórico-conceitual em uma perspectiva crítica da descolonização, nos referenciais afrodiaspóricos e do feminismo negro, ainda são reduzidos. Essa descolonização é necessária e precisa estar atrelada ao debate de gênero, pois os estudos nos apresentam um marco temporal que a construção de um feminismo branco, presente na academia, não dá conta de reconhecer e pautar as lutas das mulheres negras. bell hooks versa sobre o papel das mulheres na construção da ciência, na academia, afirmando que: “o campo acadêmico de escrever sobre crítica e ou pedagogia feminista continua sendo antes de tudo um discurso feito e ouvido por homens e mulheres brancas”. Assim, no ensino e nos estudos feministas negros, é necessário localizar as experiências das mulheres negras a partir da sua própria voz, da sua realidade, sair da dominação dos estudos das mulheres brancas, reconhecendo as diferenças de condição feminina sobredeterminadas pela raça e pela classe social. Neste sentido, marca-se que a partir da década de 70, mulheres negras como Angela Davis, Toni Morrison, Alice Walker, Audre Lorde e outras “quebraram o silêncio” e ergueram voz sob o ponto de vista autodefinido e coletivo sobre a feminilidade negra. Patrícia Hill Collins também destaca que mesmo as mulheres negras tendo voz agora no espaço acadêmico, onde seus textos em sala de aula são bem-vindos, mas que a presença em si ainda está negada, criando uma ilusão de mudança, mascarando as políticas institucionais que as excluem dos espaços coletivos. Fica evidente que o processo colonizador nos coloca “dentro de uma máquina ensino” racista e sexista, que nos educa a partir da perspectiva da linguagem e da cultura do dominante, lugar este que enquadra nossas ideias e produções, sendo confortável para este grupo dominante. Este é o lugar da margem em que vivemos, espaço “periférico, de perda e privação”. Portanto, eis a importância de contrapor essa história colonial patriarcal racista, que constrói a base das universidades ocidentalizadas, permanecendo na supremacia epistêmica e uma autoridade na construção do conhecimento e da ciência, para que possamos sair da margem, chegar ao centro e desconstruir esse sistema opressor.
Conclusões/Considerações finais Longe de querer concluir um problema tão complexo, compartilho caminhos já existentes. O primeiro, precisamos assumir que a maioria da população brasileira é negra, de mulheres negras, não se trata de pautas minoritárias, pós modernistas, identitária, é reconhecer a nossa produção histórica e cultural de origem africana e indígena. Precisamos descolonizar a ciência não só na perspectiva europeia, também na do norte global imperialista (Estados Unidos) sobre o sul global, e é nesse contexto, que se coloca a necessidade de que os currículos das graduações em saúde tenham em sua estrutura autoras feministas negras, Lélia Gonzales, Beatriz do Nascimento, bell hooks, Patricia Hill Collins e dentre tantas outras. Mas para além, que possamos não só descolonizar enquanto recorte, como alternativa, mas enquanto uma estratégia de luta e resistência, recentralizando a localização cultural, política e econômica da nossa constituição histórica africana e indígena de América Latina.
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