Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO2.3 - Movimentos sociais e lutas pela garantia da atenção adequada à saúde

46881 - ATIVISMO, IDENTIDADE COLETIVA E PARTICIPAÇÃO SOCIOPOLÍTICA: A TRAJETÓRIA DO MOVIMENTO SOCIAL DE AIDS NO EIXO SÃO PAULO – RIO DE JANEIRO
RENATO BARBOZA - INSTITUTO DE SAÚDE - SES/SP, ALESSANDRO SOARES DA SILVA - ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES - USP


Apresentação/Introdução
A participação popular e o exercício do controle social das políticas públicas de Aids no Sistema Único de Saúde (SUS) é um tema estratégico na agenda de pesquisa do campo da Saúde Coletiva.

Objetivos
Analisou-se a produção da identidade coletiva dos ativistas do movimento social de Aids no eixo São Paulo – Rio de Janeiro, quanto à participação e o controle social da política de Aids no SUS, no período de 1980 a 2023.

Metodologia
Trata-se de uma pesquisa de doutorado em Psicologia Social delineada como um estudo exploratório, descritivo, retrospectivo, transversal, ancorado na abordagem qualitativa. A coleta dos dados baseou-se em 29 entrevistas semiestruturadas e em profundidade com ativistas do movimento social de Aids paulista e fluminense. As entrevistas foram gravadas, transcritas e submetidas à análise de conteúdo. Analisaram-se as narrativas à luz do referencial teórico-metodológico do Modelo Analítico da Consciência Política, constituído por 7 dimensões e sistematizado por Salvador Sandoval (2015) no campo interdisciplinar da Psicologia Política. Particularmente elegeu-se a dimensão da identidade coletiva como elemento estruturante da análise.

Resultados e discussão
No que tange às movimentações do movimento social de Aids, apreendidas a partir da sistematização da linha do tempo e da análise de conteúdo das narrativas, depreende-se que a institucionalização das ONG/Aids definiu na década de 1980, as bases do movimento social brasileiro de luta contra a Aids, além da emergência de novos sujeitos sociais vinculados a um “ativismo de urgência”. Posteriormente, a criação dos Fóruns Estaduais de ONG/Aids, pioneiros em São Paulo e Rio de Janeiro, fortaleceu sobremaneira a articulação e abrangência das ações coletivas, bem como as práticas do ativismo sociopolítico na luta pelo direito à saúde das pessoas vivendo com HIV/Aids (PVHA) alinhada à Constituição de 1988. O último arranjo institucional identificado se referiu à organização e à estruturação das redes identitárias, inicialmente a Rede Nacional de PVHA, seguida pelas Cidadãs Posithivas, os Adolescentes e Jovens e por último as Pessoas Trans. O mapeamento histórico evidenciou 6 períodos complementares na resposta sociopolítica e sanitária de enfretamento ao HIV/Aids, demonstrando conexões políticas com atores governamentais, oriundos das coordenações de IST/Aids das 3 esferas. O movimento homossexual brasileiro desempenhou papel estratégico no período que antecedeu a emergência da Aids e a posteriori nas ações de incidência política culminando nas primeiras respostas governamentais em São Paulo e Rio de Janeiro. Os Encontros Nacionais de ONG Aids (ENONG), seguem em curso desde 1989, sendo o principal lócus de deliberação da agenda e eleição de representantes para o Conselho Nacional de Saúde, comissões assessoras, comitês e grupos técnicos do Ministério da Saúde e do Programa das Nações Unidas sobre HIV/AIDS. Apesar da consolidação dos ENONG, a análise evidenciou vulnerabilidades no papel dos delegados. Por um lado, o acirramento das disputas de poder entre os pares e de outro, a fragilidade ou ausência de mecanismos para monitorar avanços e gargalos das propostas e moções aprovadas em plenária, endereçadas aos entes públicos e colegiados paritários não restritos ao SUS. Os ativistas explicitaram tensões e disputas políticas entre as ONG/Aids, os fóruns estaduais e as redes identitárias. Observaram-se tensionamentos no acesso ao financiamento, à transparência nas relações com o poder público nas 3 esferas e disputas por assentos nos colegiados e grupos de trabalho. Os depoimentos sublinharam outros nós consonantes à sustentabilidade do movimento, como o envelhecimento dos ativistas, a falta de quadros técnicos, a formação e renovação de lideranças, particularmente entre adolescentes e jovens vivendo com HIV/Aids. No que tange à participação e exercício do controle social da política de Aids, vocalizaram lacunas e desafios, como a participação diminuta nos conselhos e conferências de saúde, sobretudo nas esferas municipais e estaduais; a fragmentação dos processos de trabalho; a falta de uma linguagem comum entre os pares; e deficiências na formação técnico-política dos atores em ambos os estados. Ademais, relataram desconhecimento e desinteresse das PVHA na participação nos conselhos gestores das unidades de saúde. Denunciaram, ainda, o incremento do conservadorismo e negacionismo científico no governo Bolsonaro, marcado por ataques constantes às minoras sociais, à disseminação de fake news sobre as PVHA e discursos de ódio. A COVID-19 aprofundou desigualdades socioeconômicas e iniquidades em saúde, aumentando, assim, as vulnerabilidades das PVHA e de LGBT+.

Conclusões/Considerações finais
Os achados corroboraram o pressuposto de que identidade coletiva dos ativistas das diferentes gerações do movimento social de Aids nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro incidiu politicamente no processo de participação e controle social da política de Aids no SUS.