Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO3.3 - Formação crítica, sensível: o olhar para a Saúde Mental e a Promoção da Saúde

46329 - SOFRIMENTO PSÍQUICO DE COTISTAS NEGROS NA PANDEMIA DE COVID-19: REPERCUSSÕES E ENFRENTAMENTOS
ELEONORA PEREIRA DE MELO - UFC, NARA MARIA FORTE DIOGO - UFC, ANA THAIS DE ALBUQUERQUE NORÕES BOUTALA - UFC, AMANDA CAVALCANTE FROTA - UFC, ERINALDO DOMINGOS ALVES - UFC, FREDDY VASQUEZ YALI - UFC, LUIZA MARIA DIAS FIRMEZA - UFC, MARCO TULIO GERARDO SOLANO GARCIA - UFC, PATRICIA DO NASCIMENTO SILVA - UFC, RENATA DE BARROS BRUNO XIMENES - UFC, VALNIZA ARAUJO DA SILVA - UFC, MÁRCIA MARIA TAVARES MACHADO - UFC


Apresentação/Introdução
Na universidade, apesar da implantação da Lei das Cotas, em 2012, estudantes negros afirmam que o processo de exclusão é ainda evidente, tendo em vista as relações hierárquicas dadas no Ensino Superior. Tal situação faz com que os seus modos de ser e seus saberes sejam constantemente inferiorizados, o que, por consequência, acarreta sofrimento psíquico, que ficou ainda mais exacerbado no contexto da pandemia de covid-19. Assim, é importante conhecer como as mudanças repentinas nas atividades acadêmicas causadas pela pandemia ressoaram nos diversos aspectos da vida dos cotistas de universidades públicas, grupo historicamente vulnerabilizado.

Objetivos
Objetivou-se, com este estudo, compreender as repercussões emocionais da pandemia de covid-19 em alunos cotistas negros de graduações em saúde e suas implicações na permanência na universidade. Teoricamente, essa pesquisa se fundamenta nos estudos das relações étnico-raciais a partir da psicanálise fanoniana, que inspira pensadoras negras como Gonzalez, Carneiro e Akotirene. Raça é analisada do ponto de vista discursivo e interseccional, rompendo com perspectivas essencialistas e coloniais e favorecendo a denúncia das iniquidades do racismo.

Metodologia
Trata-se de um estudo exploratório e descritivo, de abordagem qualitativa aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFC sob o parecer de nº 5.235.278. A pesquisa contou com a participação de seis estudantes cotistas negros de diferentes graduações da área da saúde da UFC, Campi Fortaleza. O levantamento dos participantes foi realizado por meio da técnica bola de neve, seguindo os critérios de inclusão: discente com idade mínima de 18 anos que ingressou em graduação da área da saúde da UFC pelo regime de cotas para negros até o período de 2019.2. Os alunos estavam entre o 5º e o 9º semestre dos cursos de Medicina, Odontologia e Psicologia, tinham idades entre 21 e 27 anos, três eram do sexo feminino, dois do sexo masculino, e um não binário. Os dados foram coletados entre fevereiro e março de 2022 através de entrevistas semiestruturadas ocorridas por videoconferência gravada para posterior transcrição. O material foi submetido à análise de conteúdo categorial à luz do referencial teórico da pesquisa. Emergiram cinco categorias temáticas, das quais foram escolhidas para esta análise: 1) Sofrimento Psíquico dos estudantes negros cotistas em tempos de covid-19; 2) Estratégias de enfrentamento durante a pandemia.

Resultados e discussão
Os relatos apontaram que o período pandêmico levou ao sofrimento psíquico de todos os participantes, com falas referindo medo, angústia, elevação da ansiedade, irritabilidade, crises de choro e prejuízos no sono. Tal situação gerou desmotivação, fadiga mental e cansaço excessivo, o que trouxe interferências importantes no desempenho acadêmico e levou a alguns deles cogitar desistir do curso. Dentre os fatores relatados que contribuíram para este quadro, estão: excesso de atividades acadêmicas e não adaptação para o ensino remoto por parte dos professores; isolamento social; medo do contágio por covid-19; ambiência desfavorável no lar para os estudos; e dificuldades financeiras.
Em uma perspectiva interseccional, entende-se que a pandemia afeta diferentemente os alunos de acordo com os marcadores sociais de raça, classe e gênero. O cruzamento desses marcadores posiciona os sujeitos em termos de maior ou menor garantia de direitos, sendo os homens ricos e brancos mais protegidos, e as mulheres negras e pobres mais vulnerabilizadas. Como se sabe, as raízes históricas dessas desigualdades remontam ao período colonial que se baseou na racialização das populações invadidas. As características étnico-raciais dos estudantes negros cotistas inseridos em cursos elitizados poderiam, assim, invisibilizar suas necessidades.
Das estratégias de enfrentamento mencionadas, o acionamento da rede de apoio sociofamiliar foi apontado integralmente como fundamental para a manutenção da rotina de estudos e a permanência no curso. Os aquilombamentos são fenômenos visíveis nas universidades, onde os estudantes negros oferecem suporte uns aos outros. O contato com grupo de estudos e coletivos de alunos negros na universidade pode promover maior enfrentamento da pandemia e do epistemicídio, esse considerado parte da estratégia de eliminação da população negra a partir da exclusão dos saberes ligados à afrocentricidade, bem como a invisibilização de sujeitos negros como produtores de conhecimento.

Conclusões/Considerações finais
Consideramos que estudar os aspectos da saúde mental de estudantes cotistas negros nas graduações em saúde e a viabilidade de suas permanências na universidade contribui para a formação de profissionais de saúde embasados na Saúde Coletiva para atuação no SUS. Esses graduandos são potenciais fomentadores e cuidadores de seu povo, mobilizadores sociais, técnicos e científicos para a redução das iniquidades.