47616 - O QUE AS CUIDADORAS TÊM A TRANSMITIR E NOS ENSINAR: A EXPERIÊNCIA DE UM GRUPO DE RESPONSÁVEIS EM UM CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL INFANTOJUVENIL. MÔNICA MONTEIRO PEIXOTO - FESAÚDE, ALDA MARIA SALVADOR DE SOUZA OLIVEIRA - FESAÚDE
Contextualização A família, por muito tempo foi culpabilizada pelo adoecimento psíquico do seu membro familiar. No século XX, o hospital psiquiátrico detinha o protagonismo da assistência ao indivíduo em sofrimento psíquico. Sendo as famílias excluída do cuidado. Com o surgimento dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que possuem seu marco legal a partir da Lei nº 10.216/2001 o cuidado ao indivíduo em sofrimento psíquico passa a ser protagonizado em liberdade, no território com a participação ativa da família e da sociedade.
As crianças que são acompanhadas no CAPSi chegam trazidas por um adulto, e embora a equipe dê a criança lugar de fala, muitas precisam e são ditas por este adulto que as acompanham. Desta forma, é imprescindível que a equipe consiga discernir o que é a demanda familiar e a demanda da criança. Observa-se que a oferta de serviços não corresponde as necessidades em saúde mental de crianças e adolescentes. Por assim ser, a presença deste familiar é fundamental na elaboração do Projeto Terapêutico e no exercício do controle social da Política Pública para a infância.
Descrição O grupo de responsáveis se destina àqueles que se ocupam dos cuidados da criança/adolescente em acompanhamento no CAPSi do município de Niterói/RJ, entendendo que muitas vezes essa função está com a família extensa ou afetiva. A ideia é que os responsáveis possam compartilhar entre si suas experiências cotidianas de cuidado, buscando a lógica do suporte entre pares. Atualmente, o grupo é mediado por uma profissional do CAPSi que, quando convocada ou considera necessário, oferece orientações. Todavia, a ideia é que o grupo possa se nutrir da troca de experiências em primeira pessoa, um conhecimento que deve ser valorizado.
O grupo acontece quinzenalmente, tendo uma hora de duração. Devido às atividades que acontecem no CAPSi no horário, o grupo aglutina cuidadores de crianças, sendo interessante pensar em outros turnos que contemple a temática adolescente.
Período de Realização O presente trabalho analisa os registros dos encontros pelo período de um ano, entre maio de 2022 e junho de 2023.
Objetivos Temos como objetivo elencar as categorias prevalentes nas narrativas dos responsáveis.
Resultados O grupo é formado majoritariamente por mulheres, o que evidencia a histórica posição de cuidado relegada ao gênero feminino, que atravessa gerações. A solidão é tema constante dessas mulheres. Elas reconhecem a importância de uma rede de suporte no cuidado de uma criança, mas, na maioria das vezes, contam com pouco ou nenhum apoio. Falam de uma anulação de si, dos seus desejos, sonhos e até do seu autocuidado, frente às intensas demandas da criança, o que não é sem consequências. Tomando o conceito de território, tão caro à saúde mental, por dizer desse espaço de trocas onde a vida acontece, é preocupante ouvir que, devido à violência urbana, as crianças são mantidas em casa, em espaços reduzidos, repercutindo no processo de socialização. Além disso, diante do preconceito já sofrido, algumas cuidadoras preferem não ir em festas e afins, o que gera um ciclo vicioso de isolamento social.
A relação com a escola se desdobra em diversos fatores: vivências de bullying; insuficiência de professores de apoio na rede de educação; necessidade do laudo (o que produz uma discussão sobre o diagnóstico na infância e sobre acesso a direitos); implicações da redução do turno escolar; falta de capacitação dos professores; reflexões sobre o balanço entre proteção e autonomia; e o questionamento sobre o que é uma escola inclusiva.
O grupo compartilha estratégias provisórias para lidar com os momentos de crise. Aparecem relatos emocionados sobre como é receber a agressividade da criança. Por mais que haja um entendimento racional, lidar com o fator afetivo é muito difícil. As cuidadoras apontam a diferenciação entre “birra” (sic) e crise, nem sempre possível, mas que leva a condutas distintas. Relatos sobre o manejo com a medicação são frequentes. As cuidadoras identificam uma relação entre os sintomas da criança e os conflitos familiares, em especial a vivência de abandono, relações abusivas e processos litigiosos entre os pais. Também trazem a relação entre irmãos e o desafio de dividir a atenção quando uma criança demanda maior suporte. As cuidadoras apontam a construção de “uma voz ativa” (sic) com a criança, isto é, uma contenção pela palavra.
Aprendizados Relatos de cansaço e até mesmo exaustão são frequentes, o que nos convoca a pensar o cuidado de quem cuida.
Observa-se o quanto o estigma aponta e aparta o que é diferente, sendo a transformação cultural o desafio maior da saúde mental.
Análise Crítica Há uma sensação de alívio quando essas mulheres compartilham suas dores. Se o tema solidão é tão premente nas falas, aqui aparece por um outro aspecto: o conforto em saber que não se está só, outras pessoas passam por questões semelhantes, promovendo, portanto, uma escuta empática ao outro.
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