Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO4.3 - Produção do cuidado e saberes compartilhados

48145 - MUDANDO OS ÓCULOS: A VISÃO SISTÊMICA DA VIDA NO OLHAR DE UM MÉDICO DE FAMÍLIA E COMUNIDADE
ROGÉRIO DA SILVA LOGRADO JÚNIOR - ESCOLA NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA - FIOCRUZ


Apresentação/Introdução
A vida é um fenômeno que possui diversas ambiguidades quando observada de perto: como entender o caráter social de uma doença causada por um patógeno específico conhecido mas que praticamente não aparece em países com regimes de bem-estar social?; Como entender os limites do objetivo numa prática científica generalizante como a medicina, que, entretanto, aborda histórias que para além de casos clínicos são testemunhos de histórias singulares de violência intrafamiliar?; Como perceber que em alguns casos, pessoas expostas a situações semelhantes, não se tornam enfermas? O olhar sobre o fenômeno da vida e suas ambiguidades indissolúveis em vista a entender esta entidade para além do relativismo histórico — com suas diferentes formas datadas de explicar este fenômeno — pode ser chamado de Hermenêutica (GADAMER, 2007).

Objetivos
Refletir sobre a visão sistêmica da do processo saúde-adoecimento à luz das referências da Saúde Coletiva e Medicina de Família e Comunidade.


Metodologia
Entendendo o processo filosófico que envolve lidar com um tema que possui explicações ambíguas e até mesmo opostas, a Dialética é uma forma que se encontra para tentar se chegar a uma síntese, através da exploração das contradições que marcam este tema (PLATÃO, 2019). Descreve-se, desta forma, a visão sistêmica da vida com base nos modelos de Capra (1982) e Engel (1977), os quais são contemporâneos. A partir disto, visa-se apreender uma visão hermenêutica de aspectos gerais dos ecossistemas sociocomunitário, familiar e individual e identificar relações dialéticas entre os ecossistemas estudados. No trabalho original de Engel (1977), este cita sete camadas isomórficas que constituem a visão sistêmica da vida: Moléculas, Células, Órgãos, Organismo, Pessoa, Sociedade e Biosfera. Como descrito anteriormente, acrescentei a camada “Família” entre pessoa e sociedade, e transformei sociedade e biosfera em ecossistema sociocomunitário. Entendendo que cada dimensão da vida humana é um ecossistema que pode condensar diferentes camadas isomórficas da teoria de Engel, optou-se por sintetizar os seguintes ecossistemas: o ecossistema sociocomunitário, que contempla a relação da pessoa com sua família e comunidade e a biosfera; o ecossistema familiar, que contempla a relação da pessoa com seu núcleo familiar; e o ecossistema individual, que contempla a pessoa, seu organismo, órgãos, células e moléculas.

Resultados e discussão
O ecossistema sociocomunitário pode ser entendido através das suas formas de influenciar os indivíduos pela realidade concreta (materialismo) e sua construção através da ação transformadora do viver (idealismo). Como isto se relaciona na dinâmica da vida é que se pode chamar de hermenêutica (GADAMER, 2007). O ecossistema familiar tem suas características estruturais determinadas e suas fases de ciclo de vida, com fatores estressores normativos e paranormativos. O ecossistema individual relaciona o indivíduo existencial com o indivíduo que também é um organismo com seus eixos de relações e trânsitos moleculares que determinam mudanças específicas influenciadas pelo existir, e pelo indivíduo que pensa no existir, que tem uma estrutura psíquica. A dimensão biofísica, a psíquica e a existencial são dimensões que não são completamente isoláveis, e só podem ser compreendidas através de suas complexas interações neuro-hormonais, simbólicas e sintomatológicas (ANDERSON e RODRIGUES, 2016).

Conclusões/Considerações finais
Uma potencialidade deste modelo proposto, é sua contribuição na possibilidade de ampliar o entendimento acerca das metáforas do indivíduo através da linguagem do seu corpo, através do sintoma. Entende-se aqui a visão sistêmica como uma racionalidade própria, como um novo paradigma que se coloca à frente do modelo biomédico, que é atravessado por marcadores sociais de diferença, e que, para além disso, envolve uma visão holística para as subjetividades.
Este novo paradigma apresenta, como se sabe sobre as outras racionalidades, uma dimensão morfológica (ecossistemas, camadas isomórficas), uma dinâmica vital (dialética, relações inter-ecossistemas), um sistema diagnóstico (sintoma e sua dimensão simbólica na narrativa da pessoa), um sistema terapêutico (metacomunicação para elaboração, abordagem individual envolvendo as diferentes dimensões do ser humano, abordagem familiar e comunitária) e uma doutrina médica (a visão sistêmica da vida) que explique o processo de adoecimento (TESSER e LUZ, 2008). A visão sistêmica da vida exige uma conceituação de saúde ampla, porém menos estratificada que a da OMS (OMS, 1946). Saúde sob este olhar é o produto da metacomunicação entre as dimensões individual, familiar e sociocomunitária da existência, conscientemente construída e inconscientemente determinada.