Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO9.2 - Racismo, formação e saúde

46234 - UMA ANÁLISE DA ABORDAGEM DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NA GRADUAÇÃO DE OBSTETRIZES
MILENA NOVAIS OLIVEIRA SILVA - USP, EDEMILSON ANTUNES DE CAMPOS - USP


Apresentação/Introdução
Apesar de ser maioria no país, a população negra é exposta a diversas formas de racismo cotidianamente. Dentre estas, o racismo institucional que pode ser entendido como a falha de instituições em promover um serviço adequado, por motivações étnico-raciais e culturais, desassistindo essa população, por exemplo, no que se refere ao acesso a serviços de assistência à saúde. Dados epidemiológicos demonstram que a população negra e indígena possuem piores indicadores de saúde. Mulheres negras e indígenas exemplificam o conceito de interseccionalidade, estando suscetíveis à opressão de gênero, racismo e desigualdades socioeconômicas, especialmente durante o ciclo gravídico-puerperal. Liderando assim, os índices de violência obstétrica e morbimortalidade materna. Desse modo, é imprescindível abordar raça/etnia na saúde reprodutiva, especialmente dentro do cenário acadêmico da Obstetrícia. O bacharelado em Obstetrícia, foi recriado em 2005 na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH- USP), assumindo um caráter menos biomédico e ampliando a assistência integral em saúde. Obstetrizes são incentivadas(os), como profissionais de saúde, a enxergar de modo biopsicossocial a pessoa que receberá a assistência. Assim sendo, é fundamental promover debates étnico-raciais na graduação, principalmente para formação de profissionais de saúde.

Objetivos
Analisar a formação e a prática profissional de obstetrizes a partir dos marcadores etnia e raça, promovendo subsídios para a ampliação do debate na grade curricular da graduação em Obstetrícia.

Metodologia
Foi realizada uma pesquisa quali-quantitativa por meio de um questionário online aplicado a estudantes e egressas(os) do Curso de Obstetrícia da EACH-USP. O questionário possuía questões abertas e fechadas sobre as percepções a respeito da abordagem racial durante a formação profissional. Para elaboração e discussão das questões foi utilizado o Plano Nacional de Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Etnicorraciais e para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana do Conselho Nacional de Educação (CNE) (lei 10.639/03), a resolução 569 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), os objetivos e metas da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), e o Projeto Político Pedagógico de Obstetrícia.

Resultados e discussão
O perfil dos respondentes é em maioria composto por pessoas que se identificam com o gênero feminino (93,1%) e pessoas autodeclaradas brancas (60,9%). Pesquisas recentes apontam para o crescimento no índice de pessoas negras em instituições de ensino superior, no entanto este número ainda não é expressivo nas regiões sul e sudeste, evidenciando a importância de políticas públicas como a política de cotas raciais (IPEA, 2020). O corpo negro ainda é visto como outridade na academia, tendo sua humanidade e intelectualidade rejeitadas e subjugadas (Kilomba, 2019). Quando perguntada(os) se consideram importante debater relações étnico raciais durante a graduação, 97% apontaram que sim, para mais, 99% acreditam que essas discussões impactam na prática profissional. Embora considerem importante esse debate, boa parte dos entrevistados desconhece as diretrizes propostas pelo CNE, CNS e pela PNSIPN que recomenda a abordagem de temas étnico-raciais na graduação. Sendo assim, levanta-se a reflexão sobre as pessoas que estão protagonizando a produção de conhecimento no país. Boaventura de Sousa Santos utiliza o termo epistemicídio que denuncia a destruição de conhecimentos advindos de povos colonizados, configurando um braço do genocídio causado pelos colonizadores. O racismo epistêmico está enraizado no ambiente acadêmico e prejudica a elaboração de pesquisas e estudos que privilegiam populações não brancas (Mateus, 2019). Dentre os resultados produzidos pela pesquisa, destaca-se a criação da primeira disciplina específica que discute questões raciais na graduação de obstetrizes. A disciplina “Relações Étnico-raciais em Saúde” foi elaborada com base nas respostas da pesquisa, contando com uma bibliografia extensa que perpassa por diversas áreas de conhecimento em estudos raciais. Buscando contribuir na formação de profissionais de saúde capazes de prestar uma assistência humanizada à saúde reprodutiva de mulheres negras e indígenas.

Conclusões/Considerações finais
A partir da análise das respostas conclui-se que é necessário ampliar a realização das atividades e ações que pautam o acesso e a assistência à saúde de mulheres negras e indígenas. De acordo com os relatos, é preciso que haja abordagem transversal, ampla e qualificada nos cursos de graduação, especialmente obstetrícia, considerando que o curso tem como compromisso primordial a formação de profissionais de saúde capacitados para combater e reduzir obstáculos no sistema de saúde, prestar atendimento biopsicossocial às mulheres, crianças e familiares buscando sempre alcançar bem estar físico, mental e social de todos os indivíduos, sobretudo com equidade.