Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO10.2 - Reflexões sobre os percursos de pesquisa em Análise Institucional

47019 - ANÁLISE DE IMPLICAÇÃO DE UMA TRABALHADORA-PESQUISADORA
POLIANA SILVA DE OLIVEIRA - EERP-USP, CINIRA MAGALI FORTUNA - EERP-USP


Apresentação/Introdução
O presente trabalho parte do processo de análise do lugar de trabalhadora-pesquisadora, da primeira autora do estudo, no desenvolvimento de uma pesquisa de doutorado.
Tomamos como dispositivo a análise de implicação, compreendendo que esta se dá em processo contínuo construído a partir de diferentes afetações que auxiliam o pesquisador no desenvolvimento de uma pesquisa.
As reflexões apresentam como pano de fundo o processo de preparação de uma pesquisa-intervenção que pretende investigar as possíveis articulações entre profissionais de saúde e profissionais de outras políticas públicas, no desenvolvimento do cuidado em saúde a famílias em situação de vulnerabilização social, e apresenta como pesquisadora principal a enfermeira de um dos locais onde a pesquisa se desenvolve, possuindo assim a posição de trabalhadora-pesquisadora.
Consideramos que pesquisar é um processo, se dá em um continuum, é feito de diferentes aproximações e imersões no campo de intervenção/análise.


Objetivos
O trabalho objetiva colocar em análise a posição de uma trabalhadora-pesquisadora, no desenvolvimento de uma pesquisa intervenção e suas implicações com o campo de pesquisa.

Metodologia
Trata-se de um trabalho teórico-reflexivo sustentado pelo referencial teórico metodológico da Análise Institucional (AI) , com destaque a análise da implicação .
A análise da implicação é um dispositivo que permite a análise das relações que o pesquisador apresenta com a pesquisa, dando visibilidade às interferências institucionais que se dão no processo de se pesquisar.
As reflexões foram construídas a partir da escrita do diário de pesquisa da primeira autora, dos momentos de discussões durante o exame de qualificação e do período de doutorado sanduíche vivenciado, pela mesma, na França para aprofundamento no referencial da AI.


Resultados e discussão
Concordando com Penido (2020) compreendemos que a trabalhadora-pesquisadora apresenta uma posição de sincronicidade entre os status de trabalhador e de pesquisador, tendo também oportunidade de uma imersão diferente no campo de pesquisa, com maior contato com as dinâmicas e relações que ocorrem no mesmo. No entanto, há o perigo de tal imersão “cegar” o pesquisador, dificultando o processo de análise, fator compreendido pela AI como sobreimplicação. Indica-se a análise da implicação para auxiliar no esclarecimento das relações que o trabalhador-pesquisador apresenta com o campo de pesquisa e as instituições que influenciam esta relação.
A análise da implicação é potencial para desestabilizar os instituídos presentes no processo de pesquisa, incluindo os modos instituídos de pensar e agir que coabitam no pesquisador. Para a AI as pessoas colocam em movimento as instituições, assim os pesquisadores e seus modos de pesquisar colocam em movimento, formam a Instituição Pesquisa, e em uma relação dialética também são formados por ela.
Destaca-se na análise, a Instituição Pesquisa Científica, questionada pela trabalhadora-pesquisadora durante o período de doutorado sanduíche, no qual além de realizar um aprofundamento no referencial da AI, buscou explicar para estudantes, professores e trabalhadores franceses a pesquisa que pretendia realizar no Brasil. Este foi um momento de suspensão, de reflexão sobre sua imersão no campo de pesquisa e de questionamentos: “ o que estava fazendo era ciência?”. Pensamento inicial marcado por uma visão positivista de se fazer ciência, que prega o distanciamento, a neutralidade e que foi aos poucos sendo desconstruída pelo contato com leituras, escrita no diário e encontros sustentados pelo referencial da AI.
Revelou-se também a Instituição Enfermagem, diretamente ligada à profissão desempenhada pela trabalhadora-pesquisadora e a Instituição Raça ligada a sua vida pessoal, pois é uma pessoa negra. As relações sobre estas instituições tiveram destaque durante o exame de qualificação da trabalhadora-pesquisadora diante do questionamento sobre a produção de dados da pesquisa que previa a escuta apenas de trabalhadores, quanto às possíveis práticas intersetoriais desenvolvidas, e pouco destaque ao fator raça que demarca o contexto de vulnerabilidade de grande parte das famílias brasileiras.
Infere-se que a trabalhadora-pesquisadora apresentou um movimento de resistência no que se refere a escuta das famílias na produção dos dados da pesquisa e da influência dos determinantes raciais. Em geral, na prática dos serviços de saúde, há um movimento de pouca escuta das famílias e incipiente consideração dos determinantes raciais na produção do processo saúde doença da população.



Conclusões/Considerações finais
A reflexão apresentada é potente para afetação e ressonância para outros trabalhadores-pesquisadores e pesquisadores em geral. A análise da implicação revelou as interferências institucionais e permitiu uma ressignificação do processo de pesquisa por parte da trabalhadora-pesquisadora e uma reorganização do projeto de produção de dados.