02/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO19.2 - Fomes, interseccionalidades nas políticas públicas em Alimentação e Nutrição |
46192 - ANÁLISE DOCUMENTAL DOS INQUÉRITOS POPULACIONAIS NO BRASIL SOBRE A CATEGORIA RAÇA/COR E A FOME ELOAH COSTA DE SANT‘ANNA RIBEIRO - UFRJ, LUANA TEIXEIRA GHIGGINO - UFRJ, ALINE ALVES FERREIRA - UFRJ, MICAELA MARQUES SANTANA ALVES - FIOCRUZ
Apresentação/Introdução O uso da categoria raça/cor em inquéritos populacionais permite o monitoramento dos indivíduos e domicílios. O Brasil é marcado historicamente por conflitos étnicos-raciais, impactando a renda, o acesso à alimentação adequada e saudável, e consequentemente, aumentando a experiência da fome e insegurança alimentar (IA). Autodeclarados pretos/pardos, apesar de representarem a maior parte da população brasileira, possuem a maior parte dos seus direitos violados, incluindo o direito humano à alimentação adequada.
Objetivos Realizar uma revisão documental sobre o uso da categoria raça/cor em inquéritos nacionais que avaliaram a IA.
Metodologia Trata-se de um estudo baseado numa revisão da literatura, do tipo documental, durante o período de janeiro a abril de 2023. Analisaram-se inquéritos populacionais brasileiros que analisaram a categoria de raça/cor (pretas, pardas, brancas, amarelas ou indígenas) e a situação de IA. Considerou-se a situação de IA aferida através da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) em domicílios. A busca ocorreu a partir da plataforma do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e na busca manual nos inquéritos da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e SAN (REDE PENSSAN). A seleção dos documentos foi baseada numa pré-análise, onde foi delimitada as palavras-chaves, hipóteses, organização/fichamento dos achados e análise dos dados coletados.
Resultados e discussão Foram localizados 70 documentos, compondo variadas edições dos Inquéritos Populacionais, porém, somente 6 pesquisas utilizaram a categoria da raça/cor correlacionando à situação de IA, tendo como início o ano de 2004. Ressalta-se que neste ano ocorreu a validação da EBIA, possibilitando analisar a experiência da fome em domicílios do Brasil. Além disso, este período é marcado pelo convênio do IBGE com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, e ainda, a instituição do Programa Fome Zero e programas de transferência de renda, como o Programa Bolsa Família, destinados às pessoas em vulnerabilidade social. Destaca-se que o racismo estrutural impactou em piores condições de vida, indicadores de saúde, escolaridade e acesso à alimentação para pessoas negras e indígenas e uma política nacional voltada à garantia da saúde da população negra. Nesse sentido, nos anos de 2004, 2009 e 2013 evidenciou-se uma diminuição em todos os níveis de IA entre as categorias de raça/cor. Em 2014, apesar da saída do país do mapa da fome mundial, os relatórios apontaram a presença da fome persistente e estrutural sobreposta em populações específicas, como a negra e indígena. A partir de 2015, o Brasil emergiu numa crise econômica e política, e a Pesquisa de Orçamentos Familiares 2018 apontou retrocessos na Segurança Alimentar nacional. Neste mesmo ano, o país retornou ao mapa da fome, impactando em todos os eixos já vulnerabilizados na sociedade. Dentre os aspectos cronificados da presença da insegurança alimentar, principalmente em seus piores níveis (moderada e grave), em negros e indígenas, os estudos apontaram para a intersecção com outros determinantes sociais, como o gênero. Em 2019, ocorreu uma série de desmontes de políticas públicas e programas de alimentação e nutrição, afetando diretamente o acesso aos alimentos dentro dos domicílios. Em seguida, a pandemia da COVID-19 (2020) transformou-se em uma epidemia da fome, juntamente com o aumento das desigualdades sociais no país. O I VigiSAN apontou que 19,1 milhões de brasileiros estavam em IA grave, sendo mais alarmante nos domicílios chefiados por mulheres pretas/pardas. Em 2022, o número chegou em 33,1 milhões de pessoas sem ter o que comer, onde 65% dos domicílios chefiados por pessoas negras passaram por algum tipo de restrição de alimentos, mesmo com os rendimentos mensais acima do salário mínimo. Há uma série de pesquisadores envolvidos na temática da saúde diante aos conflitos étnicos-raciais, entretanto, ainda é necessário ampliar o debate no âmbito da alimentação e nutrição. Neste contexto, a presente análise documental do determinante social raça/cor e insegurança alimentar promoveu uma visibilidade na desigualdade racial já instaurada na sociedade. A população negra é mais prevalente nas piores expressões da fome, entretanto, existem povos e comunidades tradicionais que também são impactadas pela invalidação dos seus direitos constitucionais básicos. Apesar destes indivíduos serem incluídos nas análises de dados de raça/cor dos inquéritos populacionais, ainda são invisibilizados pelos estudos não contemplarem a sua abrangência.
Conclusões/Considerações finais A desigualdade racial reflete no âmbito da soberania alimentar. A população preta, parda e indígena foram as mais impactadas pela IA, principalmente nos níveis mais graves. Faz-se necessário traçar não só o perfil da IA, como também corroborar políticas públicas e programas para o combate à fome e à miséria nesses grupos populacionais em maior situação de vulnerabilidade.
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