02/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO19.2 - Fomes, interseccionalidades nas políticas públicas em Alimentação e Nutrição |
47130 - USO DA INTERSECCIONALIDADE PARA A TRANSFORMAÇÃO DAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA ALIMENTAR E SAÚDE: EVIDÊNCIAS DE UM ESTUDO POPULACIONAL EM SALVADOR, BAHIA, BRASIL SILVANA OLIVEIRA DA SILVA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA, SANDRA MARIA CHAVES DOS SANTOS - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA, CÍNTIA MENDES GAMA - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA, MARIA ELISABETE PEREIRA DOS SANTOS - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
Apresentação/Introdução No Brasil, a insegurança alimentar tem sido associada à raça/cor e ao sexo do responsável pelo domicílio, sendo mais prevalente entre a população negra e as mulheres. No entanto, poucos estudos consideram o racismo e o sexismo como determinantes sociais que afetam negativamente o acesso aos alimentos. Para compreender melhor essa determinação, a abordagem interseccional, desenvolvida por mulheres intelectuais negras, oferece uma perspectiva ampliada das condições específicas que resultam de processos discriminatórios, dentre estes a insegurança alimentar.
Objetivos Descrever o uso do conceito da interseccionalidade na análise da insegurança alimentar.
Metodologia Foi realizado um estudo transversal de base populacional em Salvador, Bahia, envolvendo 14.713 domicílios. A Escala Brasileira de Insegurança Alimentar foi aplicada para avaliar a insegurança alimentar. A abordagem interseccional foi utilizada como ferramenta metodológica, cruzando as variáveis raça/cor e sexo para criar as categorias mulher negra, mulher branca, homem negro e homem branco para análise. Além disso, foram discutidos os resultados à luz de conceitos como racismo e sexismo.
Resultados e discussão Os dados foram analisados utilizando a perspectiva interseccional dos marcadores sociais de raça e gênero, a fim de compreender as situações de insegurança alimentar na população. Os resultados revelaram que domicílios chefiados por homens brancos apresentaram menor prevalência de insegurança alimentar (25,5%), enquanto domicílios chefiados por mulheres negras apresentaram a maior prevalência (46,8%). A abordagem interseccional proporcionou uma análise contextual desse cenário, ampliando a compreensão de como a interseção do racismo e do sexismo estrutura a posição da mulher negra no cenário da fome. Essa perspectiva permite identificar os obstáculos para acesso aos alimentos, como as dificuldades enfrentadas historicamente por esse grupo, ao receber menores salários, serem mais violentadas, e serem requeridas para posições de subserviência. O racismo cria disparidades no acesso a recursos econômicos e a mecanismos que promovem a mobilidade social, como emprego, crédito, terra e educação. Ele também restringe o acesso à justiça e à proteção policial, cria barreiras nos setores da educação, saúde e habitação. Da mesma forma, o sexismo permeia todas as dimensões da vida, com preconceitos baseados no gênero que são naturalizados e reproduzidos por meio da linguagem, da educação, do mercado de trabalho, da divisão de trabalho doméstico, da maternidade e da sexualidade, resultando em benefícios reais para os homens. Superar a fome requer uma consideração da dimensão ideológica do racismo e do sexismo, que estão presentes nas instituições e nas relações sociais, impactando a vida das pessoas. Nesse contexto há a violação do Direito Humano à Alimentação que se manifesta pela dificuldade de acesso a uma alimentação adequada e saudável e está intrinsecamente ligada à pobreza. Compreender a interseccionalidade entre raça e gênero na insegurança alimentar é um caminho para desenvolver estratégias eficazes no combate à fome.
Conclusões/Considerações finais Analisar a insegurança alimentar sob a perspectiva interseccional contribui significativamente para a compreensão dos determinantes sistêmicos desse problema, permitindo uma abordagem mais abrangente que considera as múltiplas dimensões das desigualdades e opressões que afetam grupos marginalizados. Através dessa perspectiva, é possível direcionar políticas públicas mais precisa e sensível às diferenças existentes entre os grupos, levando em consideração a complexa hierarquização social, racial e de gênero presente no contexto brasileiro. A abordagem interseccional revela não apenas a dura realidade enfrentada por esses grupos marginalizados em relação à insegurança alimentar, mas também pode ser usada para destacar sua potência e contribuição para o desenvolvimento da sociedade, bem como para a promoção da segurança alimentar e cuidados em saúde. Mas em um contexto desafiador, onde o acesso a alimentos de qualidade e em quantidade suficiente é dificultado pelo contexto socioeconômico de privação e pelas barreiras no acesso a serviços básicos, aumentam as possibilidades de desenvolvimento de problemas de saúde, como desnutrição, doenças crônicas, mortalidade materna e infantil e doenças infecciosas. Uma vez que a segurança alimentar é um determinante das condições de saúde, torna-se oportuno estabelecer um diálogo efetivo entre a Política Nacional Integral de Saúde da População Negra e a Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Essa integração visa promover intervenções específicas e sensíveis às demandas postas, bem como fortalecer os espaços de participação social, a fim de garantir que a população negra, em especial as mulheres negras, sejam protagonistas na luta contra a fome e na construção de estratégias efetivas de segurança alimentar com vistas a promover o acesso equitativo a alimentação adequada.
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