Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO24.3 - Desigualdades históricas e as resistências territoriais

46362 - POR CUIDADOS MAIS JUSTOS: PERCEPÇÕES DE MORADORES DE FAVELAS BRASILEIRAS SOBRE O CÂNCER
ANNA CAROLINA ARENA SIQUEIRA - INSTITUTO ONCOGUIA, LUCIANA HOLTZ DE CAMARGO BARROS - INSTITUTO ONCOGUIA


Apresentação/Introdução
O câncer é um problema de saúde pública global, com altas taxas de morbidade e mortalidade, principalmente em países de baixa e média renda, com graves desigualdades no acesso a um cuidado efetivo, integral e multidisciplinar. No Brasil, são esperados mais de 700 mil novos casos de câncer para cada ano do triênio 2023-2025 e pessoas pobres, negras, com baixo nível educacional, que vivem longe dos grandes centros, e que dependem do SUS são as que têm mais chances de descobrir o câncer em estágio avançado e enfrentar barreiras de acesso ao cuidado. São escassos os dados e estudos nacionais que se debruçam sobre as percepções dessas populações vulneráveis com relação ao câncer.

Objetivos
Compreender as percepções e prioridades de moradores de favelas brasileiras sobre o câncer, sua incidência no ciclo social e hábitos de prevenção em saúde.

Metodologia
Esta pesquisa foi desenvolvida por uma ONG brasileira que apoia, informa e defende os direitos dos pacientes com câncer, em parceria com um instituto de pesquisa vinculado e presente em favelas brasileiras. Ela contou com metodologia quantitativa, coleta de dados por questionário estruturado de autopreenchimento, disparado por link para moradores de favelas, no período entre 18/01 e 01/02/2023. Na análise dos dados foi aplicada ponderação da amostra de acordo com os parâmetros da PNAD/IBGE 2021, para a população acima de 18 anos, com margem de erro de 1,8 p.p.

Resultados e discussão
A amostra contou com 2963 respondentes, todos moradores de favelas das cinco regiões do país, 81% negros, 91% escolaridade até o ensino médio, 81% classes D/E e 82% usuários exclusivos do SUS. Sobre o cuidado em saúde, 41% não realizavam exames de rotina, UBS/UPA foram os equipamentos de saúde considerados de mais fácil acesso (55%), apesar de 82% demorarem até 1 hora no deslocamento até eles. Suas percepções sobre o câncer eram negativas (63%) e 84% dos respondentes tinham algum caso da doença no núcleo familiar, com elevado percentual de desfechos de falecimento (60%). Além disso, 65% tinham muito medo de descobrir um diagnóstico de câncer, 70% deles concordaram que moradores de favela tinham menos acesso à prevenção e diagnóstico da doença, 69% tinham consciência da importância da prevenção, mas não tinham acesso aos equipamentos adequados para isso e 44% das pessoas com filhos concordaram que se tivessem com quem deixar os filhos, poderiam cuidar melhor da saúde. Identificaram como principais barreiras/dificuldades para prevenção e diagnóstico precoce do câncer: 69% dificuldade de acesso ao cuidado (dificuldade em marcar exames, falta de vagas, falta de acesso e acompanhamento médico), 62% desinformação (medo de realizar exames e de ter um diagnóstico, informações falsas, falta de informação sobre câncer e do risco de desenvolver a doença), 56% falta de infraestrutura (falta de acesso aos equipamentos de saúde adequados/especialidades) e 49% dificuldade para se cuidar/priorizar a própria saúde (falta de tempo por causa do trabalho, dificuldade de deixar hábitos nocivos). Apontaram como ações de importância para melhorar esses problemas: 77% campanhas/mais informação (espaço em serviços de saúde para tirar dúvidas, mais divulgação dos programas e ações governamentais, mais campanhas de conscientização), 67% investimento em saúde (mais instituições de saúde nas favelas/comunidade, mais médicos e profissionais de saúde disponíveis) e 42% ampliação de formas de cuidado com ajuda dos agentes de saúde. DISCUSSÃO: Os achados evidenciaram uma predominância de usuários do SUS, negros, de baixa renda e escolaridade, com baixa adesão à exames de rotina e com principal porta de entrada no sistema de saúde a UBS/UPA. A maior parte deles teve contato prévio com o câncer no núcleo familiar, com percepções atreladas à morte, sofrimento e dor. Evidenciaram que, apesar do entendimento da importância da prevenção e diagnóstico do câncer, os moradores de favela enfrentavam dificuldades para alcançá-los, relativas a barreiras de acesso a cuidados básicos em saúde, como: médicos, exames e informações de qualidade, elementos potencializados pelas questões sociais por eles enfrentadas. O pedido final desse grupo vulnerável com relação ao câncer foi por mais campanhas e mais formas de acesso ao cuidado.

Conclusões/Considerações finais
Os moradores de favelas brasileiras expressaram percepções acerca do entendimento da importância da prevenção e diagnóstico do câncer, da mesma forma que indicaram as barreiras de acesso a sua concretização, e o quanto as desigualdades influenciavam e impactavam negativamente, potencializando lacunas em suas possibilidades de acesso ao cuidado em saúde. A visibilização das necessidades dessa parcela da população, vulnerável e negligenciada, principalmente no contexto da oncologia brasileira, se faz necessária e fomenta a criação de políticas de saúde mais justas, considerando a participação social nesse processo.