02/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO25.3 - Trabalho, trabalhadores e a pluralidade do cuidado: equipes e a relação com saberes e práticas |
46607 - CONDIÇÕES DE TRABALHO EM “VIDRO FOSCO”: (SOBRE)VIVÊNCIAS DE TRABALHADORES DE SAÚDE NA PANDEMIA DE COVID-19 RAQUEL BARBOSA MORATORI - EPSJV/FIOCRUZ, MARIA RUTH DOS SANTOS - EPSJV/FIOCRUZ
Apresentação/Introdução Este relato de pesquisa apresenta as dificuldades dos trabalhadores da saúde na pandemia de COVID-19, associadas à ambiência, organização e relações nos espaços de trabalho, que compreendem as pressões e os constrangimentos presentes no dia a dia do cuidado, assim como expressam as condições em que o trabalho é exercido. Essas condições de trabalho circunscrevem situações que geram sofrimento e nas quais são experienciadas pelos trabalhadores, a falta de recursos e de medidas de proteção ao trabalho; a estigmatização que se desdobra em preconceito, exclusão e rejeição; as desigualdades ocupacionais e as disputas, hierarquias, conflitos, segmentação e segregação entre e intragrupos ocupacionais, no trabalho em saúde.
Objetivos O objetivo deste estudo foi analisar denúncias e encaminhamentos de questões sobre relações, condições e segurança do trabalho dos trabalhadores da saúde, num contexto de pandemia de COVID-19.
Metodologia Tratou-se de uma pesquisa de caráter qualitativo, visando compreender o ponto de vista dos trabalhadores da saúde sobre suas condições de trabalho e suas estratégias de (re) existência no contexto da pandemia de COVID-19, utilizando como estratégias metodológicas: a) análise documental; b) a interação com trabalhadores da saúde através das redes sociais e aproximação com 30 trabalhadores que atuaram ou atuam com a COVID-19 na FIOCRUZ e c) dados secundários e histórias, depoimentos e relatos que foram acompanhados nos meios on-line.
Resultados e discussão Em linhas gerais, o que os relatos e depoimentos dos trabalhadores nos contaram foram:
• Sentimentos de dor, medo, violência, assédio moral, impotência, desamparo, ansiedades permanentes, exaurimento físico, emocional e mental, adoecimentos e mortes, em condições de trabalho cruéis e violentas, que maximizaram as antigas penosidades, atualizando-as em (ultra) penosidades.
• Dificuldades de planejar e organizar o trabalho coletivo em saúde para a formação e o exercício com segurança e qualidade; sofrimentos associados à exposição a acidentes, contaminação e adoecimento;
• Esgotamento e desgaste devido à necessidade de regulação autônoma do trabalho diante das restrições impostas pelas condições precárias;
• Trabalho intensificado gerador de sobrecarga associado à ausência de trabalhadores em número suficiente e à divisão desigual do trabalho na equipe.
• Sentimento de subordinação e desqualificação do trabalho; sofrimentos associados à intensificação do trabalho oriunda da ausência de prática interprofissional colaborativa;
• Sentimento de desgaste e desproteção contra a violência e os maus tratos no trabalho em função de exigências de chefias e de superiores e insatisfações de usuários.
Conclusões/Considerações finais Neste contexto, podemos inferir que a pandemia de Covid 19 agrava uma situação de crise, daí a sua específica periculosidade e violência, expressa também e de modo dramático nas condições de trabalho dos trabalhadores da saúde. Como síntese destacamos:
• os marcadores de gênero, raça e classe se apresentam como determinações sociais e econômicas de vulnerabilidades para a Covid-19;
• sobreposição, justaposição e entrelaçamentos de penosidades atuando sinergicamente e desigualmente sobre os trabalhadores, acentuando a disparidade entre as diferentes categorias profissionais; realidade distintas e desproporcionais. nas condições de trabalho;
• explicita iniquidades e vulnerabilidades que marcam desigualmente as práticas profissionais e o trabalho em saúde;
• assimetria nas condições de trabalho e na distribuição de vulnerabilidades nos níveis de atenção (APS apresenta percentuais mais baixos em todas as variáveis de condições materiais de trabalho); desigualdades regionais são acentuadas (Nordeste e Norte);
• categorização e distribuição desigual das penosidades associadas às condições de trabalho;
• mortes e casos exponenciados como consequência da desproteção do mundo do trabalho, sob o domínio de políticas neoliberais.
Por outro lado, também observamos que como horizonte destes trabalhadores eles vislumbram:
• a busca do equilíbrio entre tempo de trabalho e tempo de vida em condições de remuneração adequada, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, capaz de garantir uma vida digna e proteger a saúde dos trabalhadores.
• E a defesa de pressupostos do trabalho decente em busca de igualdade de oportunidades e de tratamento a todos, combate a todas as formas de discriminação - de gênero, raça/cor, etnia, idade, orientação sexual, pessoas com deficiência, dentre outras violências e discriminações.
Por fim, destacamos que entre (ultra) penosidades associadas às condições do trabalho e (re) existências, os trabalhadores de saúde teceram e reconfiguraram práticas, afetos, cuidados, encontros e os possíveis sonháveis, que segundo Krenak, é sempre bom poder contar mais uma para adiarmos o fim do mundo.
|
|