Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO32.4 - Cuidado em liberdade: desafios para a RAPS

47919 - SAÚDE MENTAL GOIANA: DO EXPURGO E ISOLAMENTO AO SURGIMENTO DAS COMUNIDADES TERAPÊUTICAS
ELISA DE ARAUJO MEIRELES LEWERGGER - PUC-GO, ARIADNE DOS REIS MENEZES - PUC-GO, SÔNIA MARIA RIBEIRO DOS SANTOS - PUC-GO


Apresentação/Introdução
Na perspectiva estatal, em 1909, nos moldes manicomiais, para os indesejados sociais, foi criado o Asilo São Vicente de Paulo, na Cidade de Goiás, de caráter assistencialista aos “loucos mansos”, que colocavam em “ameaça” à ordem pública e promoveu a institucionalização da loucura como controle social. A realidade de Goiânia permeou o viés do Serviço Nacional de Saúde Mental, fundando-se então, em 1954, o Hospital Psiquiátrico Adauto Botelho, com o isolamento e a utilização de métodos degradantes como opções terapêuticas e de experimentação.
Com a Constituição de 1988, nota-se o fechamento de inúmeros hospitais-colônia, como o “Adauto” em 1995. Assim, evidencia-se a popularização do debate antimanicomial e decolonial, como também as conquistas do movimento sanitarista e Reforma Psiquiátrica, construídas, desde 1979, com críticas ao saber psiquiátrico pelo Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental, contrários ao centralismo hospitalar, idealizando a I Conferência Nacional de Saúde Mental de 1987.
A partir de tal luta, com a Lei Federal nº 10.216/2001, institucionalizou-se o uso de serviços comunitários de saúde mental, com a atuação dos Centros de Atendimento Psicossocial (CAPS) e das Equipes Multiprofissionais no SUS. No entanto, nota-se o investimento nas Comunidades Terapêuticas, pela Resolução nº 01/2015, com internação, que passaram a compor a rede de saúde, com caráter punitivo e eugenista.
Portanto, pretende-se analisar as práticas psiquiátricas ao longo da história em Goiás e Goiânia, em vista da formação manicomial e da mudança de paradigmas relacionados à saúde mental, bem como os avanços nas políticas públicas e na assistência aos usuários, analisando a Política Nacional de Saúde, o desmonte da Lei 10.216 e o surgimento das comunidades terapêuticas.

Objetivos
Analisar a psiquiatria na história em Goiás e Goiânia, com os fatores biopsicossociais do século XX e XXI, e os avanços que culminaram nas políticas públicas e na assistência aos usuários do sistema de saúde.

Metodologia
Trata-se de uma Revisão Sistemática de Literatura pelo Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA), assim como por pesquisas documentais de instituições, como Ministério da Saúde, Secretaria Estadual de Saúde, CAPS e a Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia.

Resultados e discussão
Historicamente, com intuito de segregar vulneráveis sociais, já apartados da civilidade pela Carta Magna de 1891, o Asilo São Vicente de Paulo “amparou os loucos”, reclusos do convívio comum, o que reflete as perspectivas segregacionista e eugenista vigentes. Com a fundação de Goiânia, nota-se a construção do Hospital Psiquiátrico Adauto Botelho, fechado pela expansão da luta antimanicomial, favorecida pelas premissas democráticas e as diretrizes para a formação de políticas públicas em relação à saúde mental no país e no Estado.
Em contrapartida, ocorreu a luta contra o isolamento de pacientes psiquiátricos, que culminou na Lei 10.216/2001 e a conquista de direitos e proteção às pessoas com transtornos mentais, o que resultou na criação dos CAPS, dignificando o tratamento e condição humana na saúde. No entanto, em decorrência de ideologias políticas, notou-se o desmonte da atuação dos CAPS e o estímulo às Comunidades Terapêuticas, remontando aos antigos “manicômios”.
Nota-se a mudança do entendimento do conceito de saúde mental ao longo dos anos, posto que o resultado do debate se iniciou com a exclusão social e a criação dos CAPS como um espaço de cuidado e projetos terapêuticos. Porém, percebe-se um retrocesso com as comunidades terapêuticas, o isolamento social, hipermedicalização e tortura, contrários ao proposto na Reforma Psiquiátrica, Constituição de 1988 e Lei Federal 10.216.

Conclusões/Considerações finais
Portanto, o processo de luta antimanicomial e decolonial mostrou-se tardio, o que ocasionou o desenvolvimento de políticas públicas relacionadas à saúde mental ainda deficitárias, mesmo considerando os avanços decorrentes do SUS e instalação dos CAPS.
Ao se analisar a história da psiquiatria e seus tratamentos em Goiás, fica evidente o uso da loucura como controle social e segregação para a “manutenção” da ordem excludente e eugenista, condicionando os “alienados” à instituições, como no Asilo São Vicente de Paulo e Hospital Psiquiátrico Adauto Botelho, com tratamentos degradantes aos preceitos da Declaração dos Direitos Humanos de 1948.
Com a Constituição Federal de 1988, a luta antimanicomial e a Lei nº 10.216, nota-se o uso de ambientes humanizados e da equipe multiprofissional nos CAPS, permitindo a interação paciente-comunidade, conforme a Portaria nº 336/2002. No entanto, em virtude dos tabus, conservadorismo governamental e o descrédito à atuação dos CAPS, instaurou-se as Comunidades Terapêuticas, com a internação de pacientes e o redirecionamento maior de verbas a essas modalidades. A partir disso, nota-se a desinstitucionalização das conquistas desenvolvidas pela Lei nº10.216 e Reforma Psiquiátrica, e a reorganização dos moldes manicomiais e excludentes.