Comunicação Oral Curta

03/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC6.2 - Territórios racializados na saúde e na educação

46942 - BRANQUITUDE: CATEGORIA DE ANÁLISE FUNDAMENTAL AO CAMPO DA SAÚDE COLETIVA
THAMIRES MONTEIRO DE MEDEIROS - FCMSCSP, FLÁVIA DE ASSIS SOUZA - IFF//FIOCRUZ, ROBERTA GONDIM DE OLIVEIRA - ENSP/FIOCRUZ


Contextualização
Este relato é fruto das vivências de três trabalhadoras no campo da Saúde Coletiva, que em seus respectivos trajetos, como pesquisadoras, perceberam a necessidade da compreensão da articulação entre racismo-branquitude-saúde. Nos interessa compreender as formas de atuação do campo frente a essa articulação, a partir, principalmente, da vivência sobre como nossos atores, discursos hegemônicos e instituições performam o pacto narcísico da branquitude (BENTO, 2012).

Descrição
O transitar pelo campo a partir de três lugares diferentes de onde são oriundas e trabalham as autoras, bem como suas diferentes marcações raciais, em articulação com literatura crítica à branquitude e a colonialidade tem possibilitado a elaboração de perguntas que orientam nossas observações, tais como: compreendendo que, dentro do empreendimento colonial a branquitude impôs-se como norma, impondo também seus esquemas de produção e validação do conhecimento, de que forma, aprendemos sobre seus postulados no campo da saúde coletiva? Qual a relevância deste reconhecimento para o campo? Quais as repercussões da manutenção dos mitos da colonialidade/pacto narcísico da branquitude para o campo da SC?

Período de Realização
2022

Objetivos
Neste relato buscaremos expor as reflexões, a partir de nossos locus de atuação profissional, com o objetivo de compreender a relação do mito da democracia racial com eventos de negação do racismo como parte da determinação social da saúde e discutir a branquitude como categoria de análise fundamental para o campo da Saúde Coletiva.

Resultados
Estudos têm demonstrado como o campo da Saúde Pública, como braço bionecropolítico (LIMA,2018), compõe em diversos momentos históricos o projeto colonial. O discurso racista colonialista inaugura um “outro” racializado enquanto enuncia uma identidade branca que se propõe ao mesmo tempo “neutra” e o “referencial do ideal humano”. Assim, a branquitude provém um constructo ideológico no qual o branco se vê e classifica os não brancos a partir do seu lugar privilegiado de mundo, processo que ao longo dos séculos sustenta vantagens aos brancos em detrimento dos não brancos, fruto de uma desigual distribuição de poder (político, econômico, social e epistêmico) e de bens materiais e simbólicos (SILVA, 2017). A branquitude opera de maneira a ahistoricizar seus privilégios, apagar seus sujeitos e tornar por natural as desigualdades raciais.
Como expressão das formas de reprodução da branquitude no Brasil, o mito da democracia racial se apresenta como um mecanismo que procura afirmar a harmonia racial no país e escamoteia as heranças do racismo estrutural brasileiro. O mito procura tornar as desigualdades raciais ahistóricas e desfiliadas de sujeitos e projetos políticos. Uma das consequências desta racionalidade é a compreensão do racismo como um problema setorizado ou um “recorte” e não como um estruturador das desigualdades no Brasil.
Procurando desfiliar-se de projetos societários que produzem desigualdades, o campo da Saúde Coletiva surge no Brasil propondo a saúde como um direito. Comprometido com a justiça social, cabe ao campo compreender que surge na colonialidade brasileira, em um contexto marcado pelo racismo estrutural, e assim, seus sujeitos e práticas não estão imunes às formas de reprodução da branquitude.


Aprendizados
A reprodução do pacto narcísico da branquitude (BENTO, 2012) conta justamente com a negação tácita do racismo, constituindo uma forma de reprodução do mito da democracia racial, e os reflexos desta negação para o nosso campo podem envolver 1) a análise simplista dos processos de saúde-doença a partir de determinantes isolados de saúde que não historicizam os processos produtores das conjunturas de adoecimento e por isso 2) a não compreensão do racismo como um determinador social da saúde, e a redução dos seus efeitos a um recorte.
Como desdobramentos da negação do racismo em nosso campo percebemos no cotidiano de nossas instituições bases curriculares majoritariamente brancas e eurocêntricas; composição do corpo docente e discente dos PPGSC majoritariamente brancos; escassez da efetivação de medidas de ações afirmativas nestes programas; e a escassez dos objetos de tese que abordem a questão do racismo, que por sua vez quando aparecem são questionados em sua validade.


Análise Crítica
O reconhecimento da imersão inescapável da Saúde Coletiva no contexto de colonialidade brasileira nos convoca a reconhecer como a branquitude opera no campo. O que fazer ao reconhecer que o campo se funda também por uma branquitude não consciente de sua branquidade? Que medidas de reparação planejar e executar a partir desta constatação? Como orientar a superação da branquitude engendrada nas instituições de saúde, nos programas de graduação e pós-graduação, nos governos e nos serviços de saúde? A nossa conclusão aponta perguntas que merecem ser feitas para os atores do campo.