Comunicação Oral Curta

03/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC5.2 - Práticas de cuidado em saúde: relatos de experiência

47693 - RELATO DE CASO: DIAGNÓSTICO TARDIO DE RECIDIVA DE HANSENÍASE DE USUÁRIA DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE EM MUNICÍPIO DE PERNAMBUCO
RAIANE DANTAS DOS SANTOS - COREMU - JG, ANDRÉIA CAROLINA SANTOS DE LIMA - COREMU - JG, DANIELA MARTINS BARBOSA DA SILVA - COREMU - JG


Contextualização
S.R.S., 49 anos, mulher, reside em Jaboatão dos Guararapes, usuária da estratégia de saúde da família (ESF). Aos 18 anos fez poliquimioterapia (PQT) de 1 ano para hanseníase, e sofreu com estigma da doença.
A hanseníase é uma doença infecciosa, contagiosa, de evolução crônica, causada por Mycobacterium leprae. Afeta a pele, as mucosas e os nervos periféricos, podendo gerar lesões neurais1. No exame neurológico classifica-se o grau de incapacidade física (GIF), de 0 a 2, e indica se há perda da sensibilidade protetora e/ou deformidade visível e/ou cegueira. O Escore OMP é a soma dos GIF de cada segmento (olhos, mãos e pés), que vai de 0 a 12, com objetivo de detalhar as incapacidades isoladamente, para melhor qualidade do cuidado2.
Em 2021, identificaram-se GIF2 e OMP4, com comprometimentos em todos os segmentos. Mesmo sem diagnóstico para hanseníase, seguiu-se com orientações para o autocuidado. No ano seguinte, a usuária retorna com queixas agravadas e comprometimentos funcionais, relatando que seus sintomas são como os do primeiro diagnóstico. Falou sobre humor rebaixado e receio de reviver o preconceito.
Apesar de já ter duas baciloscopias anteriores de resultados negativos (BAAR-), médico da ESF e médico dermatologista solicitaram novos exames cujos resultados repetiram os anteriores. Assim, a usuária sai de duas consultas médicas sem diagnóstico de novo.
Na nova avaliação: GIF2 e OMP8. Continuou-se com orientações para autocuidado. Enquanto isso, após articulações em rede, seguiu em ambulatório de neurocirurgia periférica para descompressão nervosa.
Persistindo no cuidado, a usuária é encaminhada a serviço hospitalar de referência e, em 28/10/2022, foi diagnosticada com hanseníase dimorfa-dimorfa. Iniciou de imediato a PQT de 1 ano, recebeu órteses e orientações para autocuidado.


Descrição
Trata-se de um estudo descritivo de relato de experiência, sobre vivência de preceptoras e residente de Terapia Ocupacional no Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família. Visto que Jaboatão dos Guararapes, região metropolitana de Recife/PE, é uma região endêmica em hanseníase, e que a Atenção Primária à Saúde (APS) é a porta de entrada aos serviços de atenção à saúde no Sistema Único de Saúde, faz-se necessário relatar o acompanhamento de pessoas acometidas por hanseníase para erradicar o estigma e que mais profissionais façam diagnóstico precoce, minimizando agravos na APS.


Período de Realização
Avaliação iniciada em abril de 2021 e segue ainda em monitoramento.


Objetivos
Fornecer subsídios para que profissionais da APS façam intervenção precoce e ampliada, aumentando as chances de cura sem sequelas e/ou de diminuição de agravos para usuários com hanseníase.


Resultados
O diagnóstico tardio da usuária lhe conferiu agravos, como lesões tróficas e reabsorção óssea, menor amplitude de movimento, déficit de força muscular, alterações de sensibilidade em olhos, mãos e pés, com anestesia plantar à direita. Aumento do OMP de 4 para 8, com prejuízo em desempenho ocupacional1,2.
A cirurgia foi exitosa, com reabilitação em fisioterapia. Porém, o quadro de sequelas ainda persiste, com comprometimento funcional. Desde o diagnóstico ela vem recebendo acompanhamento psicológico para quadro desenvolvido de depressão.


Aprendizados
Durante esse cuidado continuado e longitudinal foi essencial a formação e manutenção do vínculo entre usuária, serviço e profissionais, com disponibilidade e confiança. Foi necessária a persistência, em detrimento de tantas negativas de diagnóstico apesar das evidências do caso, para a continuidade do tratamento que foi iniciado tardiamente, incluindo não só a PQT como também as mudanças de costumes em atendimento às orientações necessárias ao autocuidado, o que levou um tempo para ela assimilar e introjetar na rotina. A proximidade no cuidado proporciona à usuária um ponto de confiança para acolhimento e suporte3.
Trata-se de um caso de hanseníase recebido pela APS, que poderia ter sido solucionado neste nível de atenção à saúde, mas que permeou os outros dois níveis de atenção até chegar ao diagnóstico, tendo levado um ano e meio para tal1.

Análise Crítica
O diagnóstico tardio gerou sequelas irreversíveis, desgaste e adoecimento psicoemocional. Acredita-se que este quadro poderia ser diferente em caso de acolhimento e intervenções mais atentas em níveis de APS, valorizando histórico e os dados expressivos de exame neurológico e de incapacidade funcional em detrimento dos repetidos resultados negativos de BAAR1,2. Seria essencial investigação minuciosa, buscando reduzir agravos independente da conclusão diagnóstica. Investir em capacitações que tragam a hanseníase como suspeita inicial em casos como este e estimular os profissionais da APS a atender demandas suspeitas com mais perícia, e sob a perspectiva da clínica ampliada, é fundamental para reduzir a disseminação da doença e proporcionar tratamento digno às pessoas suspeitas e/ou acometidas por hanseníase1.