Comunicação Oral Curta

03/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC3.3 - Mecanismos de equidade na formação: estratégias e vivências nas instituições

47725 - CONTRIBUIÇÕES PARA UMA FORMAÇÃO ANTIMANICOMIAL, ANTIPROIBICIONISTA E DESMEDICALIZANTE NA GRADUAÇÃO EM MEDICINA: RELATO DE EXPERIÊNCIA
SÉRGIO SEIJI ARAGAKI - UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS, FÓRUM DE SAÚDE MENTAL DE MACEIÓ E FÓRUM ALAGOANO EM DEFESA DO SUS E CONTRA A PRIVATIZAÇÃO


Contextualização
No 9º semestre do curso começam os internatos – estágios curriculares obrigatórios, onde se priorizam os aprendizados ocorridos no cuidado junto à população, nos serviços de saúde. A turma de 50 estudantes inicia, assim, o Internato em Saúde Mental, composto por diferentes serviços e práticas. Nosso relato é centrado na experiência ocorrida nos CAPS e nas discussões sobre Saúde Mental e Atenção Psicossocial.

Descrição
As ações de ensino têm sido coordenadas por um docente, psicólogo social, militante da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial, Antiproibicionista e Desmedicalizante.
Nos CAPS, estudantes de Medicina não têm estado sob preceptoria exclusiva de profissionais dessa categoria. De forma diversa, orientamos para que os aprendizados sejam feitos, prioritariamente, em atividades coordenadas por membros da equipe que sejam de outras profissões de nível superior ou as de nível médio e que trabalham como oficineiras. Assim, estudantes de Medicina têm participado de maneira ativa ou como ouvintes em grupos, oficinas e outras atividades, e não somente em atendimentos psiquiátricos. Por exemplo: acolhimentos; grupos terapêuticos; oficinas de artesanato, de pintura, de fotografia, de teatro, de culinária; atividades de convivência e de lazer, reuniões de equipe etc.
É importante registrar que, de início, essa proposta no estágio causou estranhamento tanto junto às equipes quanto à Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Mas, após explicações de que os objetivos principais eram ampliar para a ocorrência de uma formação interdisciplinar e para uma maior proximidade com a população usuária, foi aceita sem dificuldades.


Período de Realização
Início em 2012, em andamento.

Objetivos
Compartilhar a experiência de ensino que vem sendo realizada em uma faculdade de medicina de uma universidade federal do nordeste do Brasil.

Resultados
Estudantes tem tido processos de ressignificação sobre adoecimentos, doenças e sofrimentos psíquicos e mudanças de práticas de saúde junto a si e às demais pessoas. Passa-se a olhar não somente os problemas em saúde, mas reconhecer também as potencialidades de cada ser humano.
Também têm recebido cuidados por parte da equipe e também das pessoas usuárias dos CAPS. Isso tem feito perceberem que saúde não se faz para as pessoas, mas junto com elas, e que todo mundo se beneficia desse cuidado. E sempre há estudantes que relatam a surpresa e a emoção que tiveram ao aprenderem a fazer trabalhos manuais, artesanais e artísticos com as pessoas usuárias. Há potência, há vida, e não somente doenças.


Aprendizados
Aprender sobre importância do acolhimento, da escuta e da inclusão das necessidades, interesses e possibilidades, de acordo com o que diz a pessoa usuária (que antes não fazia parte do planejamento do cuidado).
Ouvir pessoas que estão sob cuidados nos CAPS tem sido aprender com elas não somente a respeito de suas histórias, mas também a conviver com as diferentes pessoas, independentemente de terem diagnósticos ou não.
Por outro lado, nas discussões teóricas aponta-se a relação entre adoecimentos psíquicos, sofrimento mental, uso de drogas e vulnerabilidades sociais. Demarca-se e destaca-se a produção histórica e a manutenção interessada, por parte de algumas pessoas e instituições, das desigualdades sociais, das exclusões de pessoas e de determinados grupos sociais, com fortalecimento de estigmas. Assim, dentre outros efeitos, nessas discussões, a determinação social da saúde deixa de ser um conceito e passa a poder operar nas práticas de cuidado.

Análise Crítica
Destacamos que a maioria de estudantes chega no estágio desconhecendo a existência dos CAPS e de outros serviços de saúde mental que não seja o hospital psiquiátrico. A formação na universidade ainda é prioritariamente biomédica, manicomial e medicalizante. Fala-se da importância da Clínica Ampliada e da determinação social da saúde, mas pratica-se, ao ensinar, uma clínica reduzida, biologicista, centrada em diagnosticar e prescrever medicamentos.
Assim, como diferencial, temos percebido a relevância do que tem sido propiciado nos CAPS e nas discussões teóricas sobre Atenção Psicossocial. O trabalho em equipe e a possibilidade de trabalho interdisciplinar finalmente deixam de ser teorias e têm sido vividos na prática. Momentos de discussão de Projetos Terapêuticos Singulares têm ampliado a clínica.
A parceria com as equipes dos CAPS tem sido fundamental. Não é o “uso de um campo de estágio autorizado pela SMS”, mas um trabalho colaborativo. A equipe tem ajudado na formação de estudantes e o docente tem feito discussões que auxiliam na educação permanente em saúde para profissionais desses serviços.
Há necessidade de melhorias, apesar de tudo. Ampliar e aprofundar as práticas antimanicomiais, antiproibicionistas e desmedicalizantes, de maneira que elas se tornem centrais na formação em saúde mental em todo ou, pelo menos, em boa parte do internato é urgente. A participação, ainda inexistente, de psiquiatra que seja docente da universidade certamente auxiliaria muito nisso. Continuamos na Luta!