Comunicação Oral Curta

03/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC10.2 - Análise Institucional e a multiplicidade de práticas na Saúde Coletiva

46828 - COLABORAÇÃO ITÁLIA - BRASIL - FRANÇA PARA A REORGANIZAÇÃO DO PROCESSO DE TRABALHO E DA FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DE ATENÇÃO PRIMÁRIA
CLARISSA TERENZI SEIXAS - UNIVERSITÉ PARIS CITÉ, LUCIANO BEZERRA GOMES - UFPB, RICARDO SOUSA SOARES - UFPB, ARDIGÒ MARTINO - AUSL ROMAGNA


Contextualização
A defesa da saúde na sua dimensão de direito humano fundamental envolve historicamente a participação de trabalhadores, gestores, políticos e atores comunitários de diferentes países do mundo. Essas ações de cooperação transnacionais, mais especificamente aquelas entre Brasil e Europa, são frequentemente permeadas por tensões oriundas dos processos históricos de colonização.
A Rede Unida, coletivo que agrega pessoas de diferentes países em torno das temáticas Saúde e Educação, tem sido, ao longo dos anos, um potencializador de formas de cooperação mais simétricas entre América Latina e Europa, pautadas em valores de democracia, equidade e justiça social. Um dos processos formais de cooperação mais exitosos até hoje é o Laboratório Ítalo-Brasileiro, que tem operado como um dispositivo de construção e compartilhamento de saberes e práticas em saúde coletiva. O projeto Sogn(Azione) nasce dessa cooperação.

Descrição
O projeto Sogn(Azione) nasce da cooperação Brasil e Itália, mais especificamente com a região Emilia-Romagna, e no seu eixo aqui relatado (Eixo APS) também se insere a França. O eixo APS propõe aproximar trabalhadores da Atenção Primária à Saúde (APS) e outras pessoas normalmente excluídas dos processos de decisão e aprofundar a reflexão acerca das rápidas mudanças no cenário assistencial. Dessa forma, intenciona reafirmar o direito à saúde através da construção de espaços de cooperação como prática da descolonização das relações internacionais e do trabalho interprofissional.

Período de Realização
O projeto foi estruturado ao longo do ano de 2022, com primeira e segunda incursão ao campo do eixo APS em fevereiro e junho de 2023, respectivamente. Uma terceira etapa presencial está planejada para outubro de 2023. Os encontros em modo remoto ocorreram durante todo o período, com periodicidade quinzenal.

Objetivos
As ações do eixo APS visam criar um espaço colaborativo decolonial que compreende a diferença como potência para fazer emergir as pistas para repensar o processo de trabalho e a formação dos profissionais de atenção primária.

Resultados
Foram realizadas duas incursões com duração de uma semana cada no cotidiano de serviços de APS da Emilia-Romagna que manifestaram interesse em participar. Nessas visitas, das quais participaram 6 pesquisadores ‘formais’, buscou-se multiplicar as possibilidades de interação com diferentes trabalhadores - médica(o)s, enfermeiras, secretárias, psicólogas, diretor de distrito, representante comunitário, residentes de medicina e seus tutores. Intencionou-se, dessa forma, compreender os desafios enfrentados pelas equipes, as necessidades de mudança dos serviços e da formação e a potência imanente ao coletivo. Ao longo de dez dias de trabalho de campo, participaram 87 pessoas de nove serviços de sete municípios da Região Emilia-Romagna.
A imersão nos serviços permitiu identificar, principalmente: a) fragmentação do trabalho com repercussões da e na formação médica, b) assistência centrada no profissional médico e organizada por patologia, c) boa relação entre profissionais, sem configurar, no entanto, trabalho em equipe, d) a necessidade de qualificar o processo de acolhimento de modo a limitar eventuais barreiras de acesso; e) a existência de iniciativas pontuais de invenção e mudança despotencializadas pela baixa capilaridade e sustentação institucional.
Com base nesse diagnóstico, realizado de forma compartilhada entre pesquisadores ‘formais’, trabalhadores e gestores, foram estabelecidos 3 pressupostos que serviram de pilar para a construção de uma proposta de formação e educação permanente: 1) o desenvolvimento das competências deve ser realizado no e para o território, 2) a formação deve se dar de forma interprofissional e intersetorial de forma a ser vetor de mudança dos processos de trabalho em saúde e 3) a integração pesquisa-formação-intervenção é condição para a mudança.

Aprendizados
As ações realizadas até o momento têm estimulado o desenvolvimento de novas conexões entres os próprios trabalhadores da APS dos territórios, criando verdadeiras comunidades de troca de experiências, práticas, ferramentas, metodologias e afetos, com foco nas pessoas e na comunidade.

Análise Crítica
O eixo APS do projeto Sog(Azione) tem possibilitado um movimento emancipatório, ao empoderar a equipe como coletivo transformador, questionando as relações de poder que dificultam as mudanças e buscando superar assimetrias entre diferentes categorias profissionais. O projeto também tem funcionado como dispositivo decolonial de cooperação internacional, fortalecendo relações simétricas Sul-Norte a partir da compreensão de que as diferenças enriquecem o olhar e potencializam a criatividade e a inovação