46335 - “TÔ COM PREGUIÇA DE PEGAR": EMOÇÕES E VINCULAÇÕES NA REGULAÇÃO DE PRÁTICAS SEXUAIS INSEGURAS ENTRE HOMENS QUE FAZEM SEXO COM HOMENS JOÃO PEDRO SOUZA DIAS - UFPE, INGRID VITÓRIA MACIEL - UFPE, MATEUS SOUZA ARAÚJO - UFPE, THAMIRIS DAYANE DE SÁ PEREIRA - UFPE, KARLA GALVÃO ADRIÃO - UFPE, LUÍS FELIPE RIOS - UFPE
Apresentação/Introdução Em se tratando da vulnerabilidade ao HIV/Aids, a categoria homens que fazem sexo com homens (HSH) é especialmente afetada; dados de 2016 apontam para 21,5% de prevalência do HIV na população HSH no Recife-PE. Nessa categoria, a transmissão do HIV está associada ao sexo anal desprotegido (SAD). Nesse contexto, é possível observar práticas denominadas soroadaptativas, ou seja, alternativas às estratégias de prevenção propostas pelas instâncias de saúde pública, como a camisinha ou a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP). Por conseguinte, a pesquisa abordou as práticas soroadaptativas a partir de uma abordagem sócio-construcionista da sexualidade, buscando a compreensão de aspectos sociais e intersubjetivos relacionados à saúde, em diálogo com teóricos como John Gagnon, Gayle Rubin, Richard Parker e José Ricardo Ayres. A partir das discussões de Judith Butler, exploramos as emoções que emergem nas interações sexuais, por meio da noção de estilizações corporais, observando como determinadas configurações de elementos do corpo criam disposições para ação, no caso o sexo inseguro.
Objetivos Compreender como os vínculos e as emoções influenciam práticas soroadaptativas.
Metodologia Os dados desse trabalho advém de uma pesquisa etnográfica feita a várias mãos entre 2019 e 2022, e envolveu observação paraticipante e entrevistas com 38 HSH, de idade variando entre 20 e 38 anos. Para esta apresentação, analisamos as entrevistas, que foram transcritas e tabuladas em um quadro temático. Considerando o quadro, o trabalho em voga foca em duas questões das entrevistas em que os interlocutores foram solicitados a descrever as três últimas cenas sexuais em que usaram e em que não usaram o preservativo masculino. Utilizamos análise temática de conteúdo, cujo foco direcionou-se aos fatores para o uso e o não uso do preservativo, as práticas soroadaptativas utilizadas e a emergência de emoções e vinculações na regulação da prevenção.
Resultados e discussão O SAD é recorrente entre nossos entrevistados. Ressalte-se que, na maioria dos casos, o SAD aconteceu sem conversa e testagem prévia - o que a literatura denomina segurança negociada - de modo que, podemos dizer que a soroescolha é feita de modo presumido. Assim, aparência saudável aparece sub-repticiamente como condição para o SAD. Observou-se que o não uso do preservativo é mais recorrente em parcerias fixas do que as casuais. Nas parcerias fixas, ser conhecido, amigo ou namorado/marido produz confiança, articulada pela familiaridade e conhecimento dos hábitos do parceiro, criando disposições para o SAD. O tesão aparece tanto nas parcerias fixas como nas casuais, nas primeiras é um elemento que se articula com amor e confiança para aumentar a disposição para o SAD. Em algumas situações, existe a falta da camisinha, noutras, é dispensada ainda que a tenha. Neste último caso, a preguiça aparece como uma categoria emotiva importante; em algumas narrativas aparece como um relaxamento num contexto de namoro e amizade, e, em outras, emerge em meio à "agonia do tesão", como fica aparente no seguinte trecho da entrevista de Jorge (nome fictício), 25 anos: “[...] e ai a gente se beijou, e ele, ele não tinha camisinha também, apesar de que eu tinha camisinha aqui, eu disse “meu deus do céu, não tô... tô com preguiça de pegar, vou dar pra ele sem”.
Conclusões/Considerações finais As narrativas dos homens escutados sugere que há preocupação com o HIV expressa no uso de práticas de prevenção como a testagem e o uso da camisinha, ainda que, neste último caso, nem sempre de uso regular. A PrEP foi pouco mencionada nas entrevistas, certamente porque na ocasião das entrevistas ainda não era muito bem divulgada. Em discussão com a literatura internacional observamos que quanto mais as emoções e vinculações produzem familiaridade e confiança, mais facilmente a camisinha sai da cena, com relevo para as emoções amizade e amor. Esses elementos mostram a importância da disponibilização da PrEP para HSHs, especial por termos um contexto com alta prevalência do HIV. Também sugere a necessidade e explorar emoções como confiança, amor, tesão e preguiça nos materiais de educação e saúde.
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