46650 - ESTIGMA, DISCRIMINAÇÃO E ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO AO HIV ENTRE TRAVESTIS E MULHERES TRANS EM SÃO PAULO: UMA ABORDAGEM QUALITATIVA COM ENTREVISTAS EM PROFUNDIDADE GUSTAVO SANTA ROZA SAGGESE - NÚCLEO DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E SAÚDE DA POPULAÇÃO LGBT+, JOSÉ LUIZ GOMES GONZALEZ JUNIOR - UNIVERSIDAD COMPLUTENSE DE MADRID; NÚCLEO DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E SAÚDE DA POPULAÇÃO LGBT+, PAULA GALDINO CARDIN DE CARVALHO - FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DA SANTA CASA DE SÃO PAULO; NÚCLEO DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E SAÚDE DA POPULAÇÃO LGBT+, CLAIR APARECIDA DOS SANTOS - NÚCLEO DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E SAÚDE DA POPULAÇÃO LGBT+, DANIEL DUTRA DE BARROS - FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DA SANTA CASA DE SÃO PAULO; NÚCLEO DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E SAÚDE DA POPULAÇÃO LGBT+, MARIA AMELIA DE SOUSA MASCENA VERAS - FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DA SANTA CASA DE SÃO PAULO; NÚCLEO DE PESQUISA EM DIREITOS HUMANOS E SAÚDE DA POPULAÇÃO LGBT+, JAE SEVELIUS - COLUMBIA UNIVERSITY IN THE CITY OF NEW YORK, SHERI LIPPMAN - UNIVERSITY OF CALIFORNIA, SAN FRANCISCO
Apresentação/Introdução Globalmente, pessoas travestis e mulheres trans (TrMT) experimentam extrema marginalização social e econômica devido ao estigma interseccional, que entrecruza gênero, raça, trabalho sexual e o uso de substâncias, gerando um contexto social de maior vulnerabilidade e risco para o HIV. No Brasil, TrMT têm uma probabilidade de infecção 55 vezes maior do que a população em geral; contudo, a realização de testes de HIV e profilaxia pré-exposição (PrEP) entre essa população é significativamente menor do que em outros grupos vulnerabilizados. Tendo em vista esse cenário, desenvolvemos uma intervenção com metodologia mista e navegação de pares, em grupo e individual, intitulada “Reduzindo o Estigma Interseccional entre Travestis e Mulheres Trans no Brasil (Projeto Manas por Manas)”, resultado de um conjunto de intervenções baseadas em evidências e estratégias de prevenção ao HIV que demonstraram viabilidade e aceitabilidade por TrMT no Brasil.
Objetivos O principal objetivo do Manas por Manas é mitigar o estigma interseccional e, assim, aumentar a adesão à prevenção ao HIV através de testagem, PrEP e outras estratégias de prevenção entre TrMT no município de São Paulo. Para fins do presente trabalho, exploraremos o componente qualitativo do projeto, em que uma sub-amostra de participantes pôde descrever em mais detalhes sua experiência na pesquisa, incluindo benefícios, desafios e expectativas, além da experiência com suas navegadoras de pares (NP), também travestis ou mulheres trans, e de como a participação no projeto impactou seus comportamentos de prevenção e sua experiência com múltiplos estigmas.
Metodologia Utilizando um roteiro semiestruturado, dividido em blocos temáticos (dados sociodemográficos; experiência geral na pesquisa; uso de testagem de HIV e PrEP; estigma e discriminação), realizamos, entre novembro de 2021 e junho de 2023, entrevistas em profundidade (EPs) com 19 participantes, selecionadas a partir de critérios que incluíram cor/raça, profissão, nível de engajamento na pesquisa e a NP responsável por seu acompanhamento, buscando, assim, a maior variedade possível de perfis. As participantes selecionadas deveriam estar em um momento inicial da pesquisa, de modo que, após terem completado o processo de navegação, fossem novamente entrevistadas a fim de relatar possíveis mudanças no que diz respeito aos temas inicialmente explorados. As entrevistas foram realizadas em ambiente privado, virtual ou presencialmente, gravadas em áudio e posteriormente transcritas.
Resultados e discussão A maioria das participantes relatou ter tido uma experiência boa ou ótima na pesquisa, inclusive com suas NP, com quem ainda mantêm contato mesmo após o término do período de navegação. Dentre as que foram entrevistadas em uma segunda oportunidade, transformações significativas, como términos de relacionamentos, perda e/ou mudança de emprego, mudança de residência e questões envolvendo problemas de saúde mental foram relatadas. No que diz respeito a estratégias de prevenção para o HIV, a maior parte afirmou ter enriquecido seus conhecimentos de maneira significativa com a entrada na pesquisa, especialmente com relação ao uso de PrEP. 7 participantes relataram fazer uso desta profilaxia na ocasião da primeira entrevista, ao passo que 4 já haviam feito mas suspenderam devido a efeitos colaterais ou por acharem que não necessitavam mais. Dentre as participantes que relataram nunca ter utilizado PrEP, somente uma relatou ter começado entre a primeira e a segunda entrevista. No que concerne à testagem para HIV, os relatos também foram variados: ainda que a maioria tenha afirmado se testar regularmente em serviços de saúde, apenas 7 haviam experimentado o autoteste, algo promovido pela pesquisa, e 5 delas tinham dúvidas sobre sua confiabilidade. Finalmente, no que diz respeito ao estigma, relatos de discriminação em serviços de saúde, especialmente em unidades básicas, foram comuns. Fatores como trabalho sexual e raça/cor também foram considerados dificultadores ao acesso a cuidados, embora algumas participantes, inclusive as que trabalham como profissionais do sexo, considerem o fato de serem TrMT como a barreira principal, em lugar de outros fatores que poderiam, em tese, representar dificuldades adicionais.
Conclusões/Considerações finais EPs permitem explorar mais detidamente temas de interesse à pesquisa; neste caso, a escolha e (não) aceitação de métodos de prevenção ao HIV, além de questões envolvendo estigma. Embora a sub-amostra selecionada seja pequena, seus achados podem contribuir para a elaboração de estratégias e políticas que levem em consideração a especificidade do estigma enfrentado por TrMT e ampliem o leque de possibilidades das quais TrMT dispõem para se prevenir da infecção pelo HIV.
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