Comunicação Oral Curta

03/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC17.2 - Saúde de crianças e adolescentes - desafios para a assistência e potencialidades do cuidado participativo

45171 - VIOLÊNCIAS SEXUAL E DE GÊNERO CONTRA CRIANÇA: URGÊNCIA PARA ANÁLISES E PRÁXIS INTERSECCIONAIS
EDYANE SILVA DE LIMA - UEL, MARSELLE NOBRE DE CARVALHO - UEL


Apresentação/Introdução
O debate sobre violências sexual e de gênero infantil e interseccionalidades, são recentes no campo da saúde, oriundos dos anos de 1990. A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS, 1996), define a violência como agravo à saúde prevenível. E a Organização Mundial de Saúde (OMS, 2002) entende a violência sexual contra criança como qualquer ato e/ou tentativa de ato sexual, usando da coação para satisfação sexual. O fator poder, é característica principal nesta relação desigual para com a criança, acrescida pela violência de gênero, a qual envolve relações entre homens e mulheres, demarcada pela submissão e dominação, particularizadas pela idade, força física e poder econômico. Majoritária e historicamente praticada pelo homem contra a mulher, meninas, pautadas no patriarcado e o androcentrismo. (SAFFIOTI, 1997) A interseccionalidade é impulsionada por acadêmicas/os, militantes de políticas públicas, profissionais e ativistas em diversos locais, sobretudo a partir do Black Feminism, por Kimberlé Crenshaw e outras pesquisadoras. As principais interseções são raça e o gênero, mas abarcam encontros como sexualidade, capacidade física, status de cidadania, etnia, nacionalidade e faixa etária, a depender das análises a serem construídas sobre os fenômenos. (CRENSHAW, 1994) Considerando que as violências sexual e de gênero contra a criança, atravessa níveis coletivos, individuais e privados, externo ou interno ao ambiente familiar, faz-se necessário discuti-las numa perspectiva interseccional.

Objetivos
Este relato de pesquisa pretende tecer análises interseccionais sobre as violências sexual e de gênero contra crianças no campo da saúde coletiva, fazendo parte do estudo de tese em andamento.


Metodologia
Trata-se de estudo de revisão qualitativa, com a análise dos dados de violência sexual do Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação) de 2011 à 2021, respaldada pela interseccionalidade.

Resultados e discussão
No Brasil, estima-se uma população de 35,5 milhões de crianças (pessoas de até 12 anos de idade), o correspondente a 17,1% da população geral. (IBGE EDUCA, 2018) Sendo registrado no período de 2011 a 2021, 382.552 denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes. (DISQUE 100, 2017 e 2020) Já o Sinan, no período de 2011 a 2021, registrou 107.467 notificações de violência sexual contra crianças de 0 a 9 anos de idade. (BRASIL, 2023)
Mesmo em diferentes fontes, nota-se a magnitude da questão, exigindo compreender suas nuances. Observando as notificações da violência sexual contra crianças, pelo Sinan, cujos os dados estão divididos nos períodos de 2011-2017 e 2015-2021, tecemos algumas reflexões. No primeiro intervalo, do total de 58.038 notificações, 43.035 contra meninas e 14.996 contra meninos. E no segundo, de 83.571 ocorrências, 64.230 contra meninas e 19.341 contra meninos, revelando alta nas notificações, bem como a violência sexual exponencialmente contra o gênero feminino. Pondera-se que, a estimativa de notificações perfaz apenas 10% dos casos. Outro elemento chamativo, é que os agressores destas meninas, a maioria são do sexo masculino, respondendo por 34.778 de um total de 47.324, e, 51.938 de um total de 67.794, apontando que os homens exercem o poder desde a infância. Corroborada pelo registro de 30.649 e 46.496 notificações, respectivamente nos períodos, contra o gênero feminino ocorrem na residência, prevalecendo o segredo de família e a insegurança daquele que deveria ser um ambiente de proteção e cuidado. Quanto à raça/etnia, a maioria corresponde a meninas pretas, com 19.782 casos no primeiro período, e no segundo, 4.399, aparecendo neste último a autodeclaração pardas que totalizaram 27.308. Revelando uma violência sexual e de gênero na primeira infância contra a menina preta e parda, demarcando relações de poder e racismo, traços históricos da submissão do gênero feminino para satisfação sexual do homem. Por fim, as regiões de onde provém o maior número de notificações são Sudeste (23.417 e 36.483) e Sul (12.597 e 18.407). Despontando para uma possível cultura da notificação e da denúncia, e consequentemente, melhor organização de serviços de cuidado e protocolos.

Conclusões/Considerações finais
A partir do exposto, percebemos que as violências sexual e de gênero remontam desde a infância. O processo de consubstanciar diferentes categorias impactam na apreensão do fenômeno, mostrando que o cuidado às crianças, devem respeitar particularidades regionais e culturais. É necessário revisitar as estratégias de enfrentamento, as diretrizes e as linhas de cuidado. Essas violências, são resultado de relações de desigualdade e sobretudo de relações de poder, traduzidas na dominação masculina e patriarcal. Demanda por debates e práxis interseccionais cotidianas, sobre o que visualizamos possibilidades eficazes para alterar este retrato da realidade brasileira, cabendo unir diversas áreas do conhecimento e práticas sociais, institucionais e culturais.