Comunicação Oral Curta

03/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC24.3 - "Nada sobre mim, sem mim": racismos, territórios e saúde integral

46484 - BREVE ANÁLISE DA NOTIFICAÇÃO DO CAMPO RAÇA/COR EM CASOS DE HIV/AIDS NO BRASIL: APONTAMENTOS PARA PERSPECTIVAS INTERSECCIONAIS
DENISE ELIZIANA DE SOUZA - ENSP/FIOCRUZ, LÉA DE FREITAS AMARAL - ENSP/FIOCRUZ


Apresentação/Introdução
Desigualdades sociais, econômicas e estruturais contribuem para limitações no acesso a serviços de prevenção e tratamento, maiores taxas de morbimortalidade e maior exposição a situações de risco. O Brasil apresenta grande diversidade étnico-racial, todavia, é atravessado por importantes disparidades, que são ainda mais pronunciadas quando consideradas por perspectivas interseccionais. Essas disparidades são observadas nos diversos agravos em saúde, e é importante que a notificação dos casos seja feita adequadamente, de forma a oferecer informações que subsidiem políticas de equidade. Este estudo apresenta uma análise da notificação do campo raça/cor autodeclarada na ficha de notificação para o agravo HIV/AIDS no Brasil em 10 anos.

Objetivos
Analisar o campo relacionado à variável raça/cor nas notificações dos casos de HIV/AIDS no Brasil; identificar tendências nas proporções de casos segundo a raça/cor; e descrever as características de raça/cor nos casos notificados de HIV/AIDS de acordo com o sexo.

Metodologia
Trata-se de estudo descritivo considerando todos os casos de infecção pelo HIV e AIDS notificados no Brasil entre 2010 e 2019. As informações referentes aos casos são obtidas por preenchimento da ficha de notificação de agravos e disponibilizado para acesso aberto por meio do DATASUS. O campo raça/cor autodeclarada é composto pelas categorias propostas pelo IBGE. Foram obtidas as médias e desvios-padrão dos casos notificados de HIV/AIDS, e as proporções de cada categoria, segundo o sexo.

Resultados e discussão
Nos anos do período do estudo, observa-se maior número de casos de HIV/AIDS em indivíduos brancos (média = 11.032, desvio padrão = 1.385) e pardos (média = 10.935, desvio padrão = 1.625). Até o ano de 2013 ambas as categorias apresentaram aumento nas proporções; a partir de 2014, entretanto, a proporção de casos entre brancos apresentou tendência de redução, ao passo que, entre pardos, apresentou tendência de aumento. Em indivíduos que se autodeclaram pretos, foram notificados, em média, 2.710 (desvio padrão = 281) casos de HIV/AIDS. Amarelos e indígenas apresentaram, em média, 124 (desvio padrão = 18) e 82 (desvio padrão = 13) casos, respectivamente. A média de casos parece corresponder às representações dessas categorias de identificação racial diante da população brasileira total, que apresenta maiores proporções de brancos e pardos (43% e 47%, respectivamente), seguida por uma proporção de 9,1% para pretos, 1,1% para amarelos e 0,4% para indígenas. A variável raça/cor apresentou, em média, 1.822 casos de HIV/AIDS (desvio padrão = 311) na categoria ‘ignorado’, sinalizando para um preenchimento incompleto ou inadequado das fichas de notificação, o que pode contribuir para limitações na identificação de marcadores. O HIV/AIDS alcança de forma desproporcional os diferentes segmentos populacionais e as diferenças são ainda maiores quando esses marcadores se sobrepõem, a exemplo da raça e gênero, sinalizando para a importância de análises com perspectivas interseccionais. Ao analisar as categorias de raça/cor segundo o sexo, observa-se maiores proporções de casos em indivíduos que se autodeclaram pretos para o sexo feminino (7,5%) em comparação ao sexo masculino (6,5%). Entre indivíduos que se autodeclaram brancos, por sua vez, observa-se maior proporção para o sexo masculino (29%) do que para o sexo feminino (25%). A categoria de raça/cor ‘ignorado’, quando analisada de acordo com o sexo, apresentou expressivas proporções, correspondendo a 36% para o sexo masculino e 40% para o sexo feminino. O conceito de raça é compreendido como uma construção social e, por sua complexidade, as categorias propostas para identificação são passíveis de construção e aprimoramento ao longo do tempo. Em estudos sobre HIV/AIDS, diferentes abordagens para além dos dados obtidos pelas notificações podem apresentar maior robustez em captar aspectos da identificação racial. Todavia, apesar das limitações, o uso da variável raça sinaliza para a importância de que as análises considerem a identificação de diferentes marcadores de desigualdades e de seus entrelaçamentos nos agravos de saúde das populações.

Conclusões/Considerações finais
Considerar a variável raça/cor em estudos sobre HIV/AIDS é fundamental para compreender as disparidades existentes e desenvolver ações direcionadas a grupos específicos. A promoção da equidade no enfrentamento da epidemia de HIV/AIDS requer uma compreensão aprofundada das intersecções entre raça, cor, gênero, classe social e outras variáveis sociais, buscando assim abordagens mais inclusivas e efetivas. Ao identificar lacunas, observa-se oportunidades de aprimoramento na forma como a variável raça/cor é utilizada nos estudos sobre HIV/AIDS no Brasil. Isso pode contribuir para a elaboração de estratégias mais eficazes de prevenção, diagnóstico e tratamento, direcionadas às populações mais afetadas e vulneráveis.