03/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC25.4 - Regionalização, intersetorialidade e saúde digital na APS |
46174 - O SUS COMO PROMOTOR DE AUTONOMIA E DE EMANCIPAÇÃO WILSON MARQUES VIEIRA JUNIOR - ANS
Apresentação/Introdução O Brasil possui um sistema de saúde público e universal, com um setor privado de saúde de grande relevância econômica, política e simbólica, como objeto de desejo da população. Os gastos privados com saúde podem representar um percentual significativo do orçamento das famílias brasileiras. O esforço em manter um plano de saúde pode comprometer o que Amartya Sen denomina como capacidade dos cidadãos, restringindo sua autonomia. A política de saúde deveria priorizar o SUS e reduzir a cobertura populacional dos planos privados de saúde.
Objetivos Considerando o conceito de capacidade, de Amartya Sen, o trabalho propõe uma discussão sobre o papel dos planos de saúde na sociedade brasileira e como o governo, por meio de políticas de saúde, restringe o papel emancipatório do SUS em benefício de interesses privados.
Metodologia Foi realizada a análise documental de material de imprensa contendo discursos e posicionamentos de atores do governo em prol do setor privado de saúde; e revisão bibliográfica sobre a temática de equidade em saúde, tendo como referencial o conceito de capacidade, de Amartya Sen.
Resultados e discussão No Brasil, cerca de 25% da população possui um plano de saúde privado. A posse de um plano de saúde está diretamente relacionada à capacidade de pagamento.
Dados da Pesquisa Nacional de Saúde, de 2019, informam que entre aqueles que possuem renda per capita de mais de 5 salários mínimos a cobertura por planos de saúde chega a 88%. Entre 2 a 3 salários mínimos a cobertura é de 54%. Observa-se o esforço de mais da metade dos indivíduos com uma faixa salarial baixa, em manter um plano de saúde.
Moraes et al. (2022) concluíram que o gasto com planos de saúde tem impacto significativo nas despesas das famílias com saúde, podendo comprometer mais de 40% do orçamento doméstico. Gastos pessoais com saúde podem gerar empobrecimento das famílias e ter um efeito catastrófico em relação à capacidade de consumo.
Por sua vez, a histórica redução do financiamento do SUS causa o esvaziamento de recursos e a deterioração dos serviços. O viés ideológico mostra o setor público sob um ângulo negativo de ineficiência e desperdício em contraponto à pretensa eficiência do setor privado. A mídia destaca aspectos caóticos do sistema público e contribui para que a população enxergue os serviços públicos como precários, influenciando a percepção da realidade da população, deteriorando a imagem do SUS.
Sucessivos governos acenaram para um incentivo ao maior acesso aos planos de saúde. Em 2013, o governo Dilma negociou com o setor de saúde suplementar formas de ampliação da cobertura por planos de saúde. Em 2018, no governo Bolsonaro, discutia-se uma proposta de “planos acessíveis” para potencializar o mercado de planos de saúde. Em 2022, o Ministro da Saúde manifestava a intenção de criar o “open health” compartilhando dados de clientes de planos de saúde com objetivo de oferecer planos adequados ao perfil de cada cliente. Segundo o então ministro, ao facilitar o acesso à saúde suplementar a medida ajudaria a reduzir a pressão sobre o SUS.
O cidadão faz um esforço para adquirir um plano de saúde, comprometendo parte significativa do orçamento familiar, pois acredita que dessa forma terá acesso a melhores serviços de saúde. A dificuldade de pagamento pode obrigá-lo a se endividar, o que se agrava na medida em que o mercado financeiro aplica altas taxas de juros. As instituições financeiras facilitam o crédito, trazendo riscos reais aos consumidores. O indivíduo endividado perde sua capacidade de consumo e tem sua dignidade diminuída pois se vê impotente em gerir seus gastos e suas necessidades e sente-se excluído da sociedade de consumo.
Para Amartya Sen (2010) o estigma da pobreza não se dá apenas pela renda dos indivíduos, mas também pela perda de capacidades civis e, em consequência, com a perda da liberdade desses indivíduos.
Sen (2010) considera que a liberdade é uma avaliação de êxito e fracasso pela sociedade, mas também um determinante principal da iniciativa e emancipação individual. A capacidade de uma pessoa é um tipo de liberdade substantiva, capaz de realizar combinações alternativas de funcionamentos, ter a liberdade para ter estilos de vida diversos, a liberdade de escolha, a autonomia para tomar decisões, com a integração de uma saudável distribuição de meios diversos para a realização de uma variedade de anseios e valores de quem detém a capacidade de escolha.
Conclusões/Considerações finais O SUS é um direito constitucional brasileiro cujo princípio de equidade necessita ser concretizado, de fato, com políticas públicas que minimizem as distâncias entre as capacidades das pessoas, permitindo seu pleno uso por todos de direito.
O pleno financiamento do SUS e a maior eficiência de seus serviços poderiam reduzir o desejo manifesto de contratação de serviços privados de saúde e o constrangimento financeiro pelo qual passam muitas famílias, contribuindo para maior capacidade, segundo Amartya Sen, e autonomia dos cidadãos brasileiros.
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