46974 - O NASF AGORA É E-MULTI: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE UM OLHAR INTERPROFISSIONAL JOSIANE TERESINHA RIBEIRO DE SOUZA - PUCV, ANA SUELEN PEDROZA CAVALCANTE - UEC, TALITA ABI RIOS TIMMMERMANN - COLETIVO ADELAIDES, GABRIEL PERDIGÃO WALCHER - ABRATOES
Apresentação/Introdução O Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) foi criado em 2008, no intuito de melhorar o escopo das ações da Atenção Primária à Saúde (APS) a partir da inserção de outras categorias profissionais que não compunham a equipe mínima de Saúde da Família. Várias adequações e modificações foram propostas ao longo dos anos, a fim de organizar as formas de trabalho e de apoio para as equipes matriciadas.
Com a mudança da gestão federal em 2019, o NASF, então denominado de Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (NASF-AB), assim como toda APS brasileira, passa a ser desqualificada, principalmente, com o encerramento do repasse de verba federal aos municípios para manutenção das equipes. Passados 4 anos de terror, necropolítica e uma sindemia sem abrangentes, enormes lacunas foram abertas no sistema de saúde e assistência social. Em 2023, com o retorno de um governo de esquerda, temos a retomada do NASF, agora intitulado e-Multi.
Objetivos Analisar as alternâncias entre o NASF (2008) e o e-Multi, a partir do conceito de interprofissionalidade.
Metodologia Trata-se de um estudo documental de cunho crítico-reflexivo. Foi realizada análise de documentos propostos pelo Ministério da Saúde desde a criação do NASF, em 2008, até a Portaria nº 635, que estabelece o e-Multi, em maio de 2023.
Resultados e discussão Se bem a Portaria nº 635/2023 é um avanço para a instituição de equipes multiprofissionais, principalmente pelo repasse de recursos federais aos municípios para implantação de equipes, priorizando municípios com maiores vulnerabilidades. No entanto, apresentamos alguns pontos de reflexão de possíveis entraves para a efetividade da colaboração interprofissional e para o cuidado ofertado aos usuários do SUS.
Apesar de propor o agrupamento de diferentes categorias profissionais, a operacionalização que a Portaria estabelece não favorece o diálogo entre os mesmos, imperando a lógica da produtividade e o engessamento dos processos de trabalho, uma vez que resgata os indicadores do Previne Brasil. Neste sentido, permanecemos na multiprofissionalidade, que não é suficiente para atender a complexidade das necessidades de saúde da população, especialmente na APS.
Há também o aumento da carga horária, a definição de categorias profissionais fixas em cada modelo de equipe, e a ampliação do número de equipes vinculadas ao e-Multi, diferentemente do que era previsto para as equipes NASF. Assim, ressaltamos a importância dos encontros entre as profissões, com clareza de papéis entre os diferentes saberes de núcleo e liderança compartilhada, fomentando o cuidado centrado nos usuários/comunidades. Para tal, é necessário disponibilidade de tempo para que ocorra a comunicação interprofissional e se efetive o trabalho em equipe, o que é dificultado pela quantidade de carga horária da nova Portaria, bem como o número de equipes vinculadas.
Essa operacionalização tanto inviabiliza o desenvolvimento de uma atuação comprometida com o componente técnico-pedagógico contido na proposta anterior, como fortalece a lógica de atendimento ambulatorial. Nessa seara, vale destacar o papel central que o apoio matricial ocupa na construção de Planos Terapêuticos Singulares em vistas a ampliar a resolutividade do cuidado e responder às demandas dos diferentes territórios da APS.
Outra das alterações realizadas com relação ao modo de NASF-AB (2017) foi quanto ao serviço de teleatendimento, o qual surge como proposta inovadora com o objetivo de aumentar o acesso aos serviços ofertados. No entanto, ao considerar a heterogeneidade do território brasileiro, deixa-se de reconhecer como possíveis consequências a promoção de uma inclusão-exclusão, seja da população mais vulnerável, como também das equipes com pouca ou sem manejo de tecnologias de informação ou estrutura e acesso a equipamentos e/ou à internet.
Dessa forma, se bem o e-Multi surge como uma esperança de retomada do NASF-AB, este apresenta aspectos diferentes (senão opostos) e, tal qual a própria história no NASF, é possível que passe por modificações e adequações conforme avance sua história na saúde coletiva.
Conclusões/Considerações finais A complexidade da saúde exige que passemos de um cuidado multiprofissional para o interprofissional, com garantia de financiamento e condições de trabalho que fomentem e viabilizem o apoio matricial como ferramenta primordial de cuidado da população, sendo o e-Multi uma estratégia de tensionamento para efetivação dessa forma de cuidado.
Entre os conflitos presentes na Portaria nº 635/2023, a reprodução da lógica de financiamento instituída a partir do Previne Brasil apresenta um risco para a atuação interprofissional e um trabalho comprometido não apenas com aspectos clínico-assistenciais, como também com o técnico-pedagógico que fora inerente ao desenho de NASF em sua origem. De tal modo, ainda que sendo um grande avanço para o cenário atual, o e-Multi carece de uma análise cuidadosa e, ao mesmo tempo, crítica de sua publicação e posta em prática.
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