03/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC30.2 - Arte, produção de saúde e vida |
47397 - PONTO DE CIDADANIA COMO PONTE: SAÚDE MENTAL E ARTE-CULTURA NA E COM A "RUA" COMO AMPLIAÇÃO DO CUIDADO. JAMILE SOARES DOS SANTOS - SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE SALVADOR, ANDREA SILVA COSTA - SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE SALVADOR, RUBENVAL LOPES DE MENESES - SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE SALVADOR, ARATON CARDOSO COSTA - SECRETARIA DE SAÚDE DO ESTADO DA BAHIA
Contextualização Tratamos da produção de saúde mental na e com a rua a partir da atuação de uma equipe multiprofissional em Salvador.
Descrição Nesse sentido, destacamos situações de cuidado, protagonismo e produção de autonomia, com foco em práticas centradas nas pessoas que usam o serviço, seja de forma momentânea ou continuada, atuando em regiões de extrema vulnerabilidade. O container foi instalado nos arredores para facilitar o acesso das pessoas e as saídas de campo em áreas de difícil acesso. Isis frequentava uma região com população majoritariamente preta ou parda, em meio a cenas de uso de crack, trabalhadoras do sexo e violência. Nesse cenário são compartilhadas cenas onde, a partir do trançado numa cabeça “que ninguém toca”, foram sendo traçados vínculos e estratégias de redução de danos.
Período de Realização Realizada a partir de março de 2021 e ainda em atividade.
Objetivos Partindo de um serviço de saúde lotado em um container, inserido na Rede de Atenção Psicossocial, narra experiências de acompanhamento e ampliação do cuidado junto a usuários em situação de vulnerabilidade que fazem uso de álcool e/ou outras drogas, tendo a rua e o que nela acontece como espaço de atuação.
Resultados Das itinerâncias pela região destacamos o acompanhamento de Hórus, encontrado numa praça com saúde fragilizada, que exigiu uma série de articulações com serviços de abordagem social, pronto atendimento e saúde mental, processo carregado de tensões, na tentativa de garantia de um espaço de abrigamento que favorecesse sua recuperação. Osiris, egresso do sistema prisional, se aproxima da equipe num período de (re)assentamento do container, após mudança estratégica. A vinculação permitiu acolhimento a situações de angústia em momentos de alucinação a partir de atividades artísticas, protagonismo na confecção de documentos básicos e construção de PTS, aproveitando o efeito terapêutico do acesso à arte, presenciando um processo onde passou a tomar para si articulações até então conduzidas pela equipe. Outros dois usuários em sofrimento foram atendidos pela equipe no espaço da rua, produzindo saúde mental em meio às calçadas, praças e estabelecimentos comerciais, sendo a “ponte” que conecta não só serviços da rede, mas eventualmente aquela que permitia o acesso a esses sujeitos. A capoeira foi potência ao tratar de forma crítica o processo de colonização do Brasil pela manutenção da arte como símbolo de resistência. Dela nasce o diálogo pela linguagem corporal, sem a verbalização das palavras, na experimentação de golpes e movimentos. Realizada tanto nos espaços da praça quanto de instituições que atendem a população em situação de rua e/ou usuários de álcool e outras drogas, incorporou a construção de momentos de envolvimento da corporeidade como forma de vinculação. Junto dela, a musicalidade das ladainhas e a música de capoeira abriu espaço para o trabalho sobre temas do contexto social, cultural e comunitário, realizados através de e ao som do toque de berimbau e pandeiro no espaço fixo onde se localizava o container. A produção de uma oficina de escritas criativas como espaço de convivências entre mulheres em situação de vulnerabilidade social, em situação de rua e/ou usuárias ou não de álcool e outras drogas, ou em sofrimento, cumpriu função de construção de momentos onde eram alimentadas reflexões frente aos processos das diversas violências sofridas por essas mulheres. A reconstrução de narrativas, mudando histórias originais apresentadas num livro de referência, permite construir novos olhares e perspectivas para personagens e para si próprias. Emergem projetos de vida que incluem o reconhecimento dos potenciais de cada uma, funcionando como espaços de escutas, acolhimentos mútuos das dores e construção de novas perspectivas através de imagens, registros das narrativas e construção de poesias.
Aprendizados A permanência na rua, seja em itinerância ou na praça, permitiu que a saúde mental rompesse os muros dos serviços, se fazendo no cotidiano. Entre tranças, desenhos, escutas e caminhadas, mesmo sem garantia de manutenção institucional, acreditamos que suas práticas podem, e devem, ser replicadas.
Análise Crítica As cenas indicam a tentativa de construção de um modelo de atenção capaz de se adaptar às necessidades dessa população, pautada na disponibilidade para o encontro e numa clínica ampliada com a inclusão de atividades culturais e de simbolização de resistências ancestrais a partir da presença constante na rua, junto a essas pessoas, consolidando processos de vinculação e acompanhamento até então inviáveis em outros serviços da rede. Atuando a partir da ampliação da linguagem para o acolhimento, ora “à frente” ou “ao lado”, com o horizonte de “estar atrás”, como suporte, a equipe acompanha trajetórias onde emergiram autonomia e vida em contextos de vulnerabilidade, potencializando acesso a direitos sociais por meio de processos de intervenção em ato, de encontro de subjetividades. Entretanto, é desafiador sustentar práticas de cuidado centradas no usuário num cenário de precarização estrutural.
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