Comunicação Oral

03/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO2.7 - Metodologias e estratégias para ampliação da participação social no SUS III

47395 - QUAL O LUGAR DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL NO SUL GLOBAL? UMA ANÁLISE COMPARATIVA DOS ASPECTOS NORMATIVOS NOS SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E DO CHILE
NICOLAS GUSTAVO SOUZA COSTA - UFC, RÔMULO DO NASCIMENTO ROCHA - UFC, FREDDY VASQUEZ YALI - UFC, CARMEM E. LEITÃO ARAÚJO - UFC


Apresentação/Introdução
Nas últimas décadas, as transições democráticas deslocaram a cultura político-institucional da América Latina a favor da legitimidade popular e da participação social no delineamento das políticas públicas (Pasto & Dalmau, 2011). Nesse contexto, a Reforma Sanitária brasileira, como projeto civilizatório, sobrepõe-se ao movimento de consolidação da democracia, com desenho do Sistema de Saúde pautado na cidadania e no controle social (Fleury, 2018). Todavia, no Chile, apesar da democratização impulsionar reformas incrementais orientadas para participação cidadã, as trajetórias privatizantes durante a ditadura pinochetista oferecem importantes limitações (Oliveira, 2020). São, portanto, sistemas distintos com incidência da sociedade na saúde com multiplicidade de práticas e de significados. Assim, comparar a participação social no Chile e no Brasil pode contribuir com o entendimento do lugar institucional constituído nas especificações do Sul Global.

Objetivos
O objetivo é analisar comparativamente os aspectos normativos da participação social nos sistemas de saúde do Chile e do Brasil.

Metodologia
Realizou-se uma análise documental de discurso das normativas da participação social do Chile e do Brasil, em perspectiva comparada. Foram analisados 16 e 11 documentos que regulamentam a participação cidadã, respectivamente, no Chile a partir de 1985 e no Brasil desde 1988.

Resultados e discussão
Três categorias analíticas foram identificadas: Constituição dos espaços institucionais, Binômio informação pública e educação popular e Implicações do setor privado. A primeira delas aponta que a participação no Chile é construída com ênfase na gestão, no diagnóstico e na planificação participativa. Instaura-se instâncias formais de participação de usuários articulados e organizações sociais, com vista para o exercício de direitos, fortalecimento do associativismo civil e respeito à diversidade de interesses e identidades culturais. Isto se dá pelo estabelecimento de Conselhos da Sociedade Civil de caráter, no entanto, consultivo e limitado, posto que a organização política privilegia uma incidência hierárquica nos processos decisórios, além da carência de técnicas de capilaridade e de autonomia nos territórios. Reconhece ainda como estratégica a incorporação de agentes comunitários, que articula a comunidade com os Centros Comunitários de Saúde da Família (CECOSF). No Brasil, por sua vez, foram institucionalizados espaços de participação na forma de Conselhos de Saúde, deliberativos e de gestão colegiada, e Conferências de Saúde nos três entes federativos. Estão previstas, ainda, estratégias indutivas para a implantação dos conselhos nos governos subnacionais, tanto condicionando a transferência de recurso do Fundo Nacional de Saúde à existência do conselho com composição paritária, quanto assegurando dotação orçamentária própria. Todavia, há espaços de gestão compartilhada, comissão intergestores tripartite (CIT) e bipartite (CIB), composto pelo Ministério da Saúde e representantes de gestores estaduais e municipais de saúde, sem previsões de representantes societais. Cria-se, assim, uma comunidade política para tomada de decisão à parte da incidência política direta da participação institucionalizada.
Em relação à informação pública e educação popular, a política chilena afirma a responsabilidade estatal de “entrega da informação” pública aos cidadãos, dado que o sujeito consciente seja capaz de se mobilizar, se fornecido o suporte necessário. O discurso propõe uma interface paternalista na relação estado-sociedade, condicionando a atividade política à tutela da comunicação institucional, o que acompanha a cultura da participação e da informação institucionalizada no Chile desde o governo da democratização até atualmente. Em contraste, as regras brasileiras dispõem a educação popular em saúde como fundamental para o diálogo permanente entre atores do SUS, em um processo bilateral e de empoderamento de lideranças e de organizações sociais.
A última categoria indica que o sistema privado no Chile - Instituições de Saúde Previdenciária (ISAPRES) - não é alvo de regulações civis, condicionado apenas à transparência administrativa. Já a saúde privada no Brasil, além da previsão de auditorias e de controle pelos conselhos de saúde, tem-se subsídio de incidência pública a partir da Comissão Intersetorial de Saúde Suplementar do Conselho Nacional de Saúde e da Câmara de Saúde Suplementar da Agência Nacional de Saúde Suplementar.

Conclusões/Considerações finais
Percebe-se, em ambos os países, sistemas de saúde com especificidades dos dispositivos participativos. Enquanto o caráter consultivo e o paternalismo do controle social chileno traz consigo restrições na inclusão de atores societais nos processos decisórios, o Brasil apresenta dimensão deliberativa dos conselhos e dialógica da educação popular, apesar da instauração de arenas políticas com inserção popular direta não prevista. Ademais, o setor privado no Chile carece de fiscalização cidadã, em contraste com o desenho de regulação da saúde brasileira.