03/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO4.4 - Famílias e olhares sobre vulnerabilidade nos contextos sociais |
46495 - ESTUDO LONGITUDINAL SOBRE TRAJETÓRIAS DE NEURODESENVOLVIMENTO EM CRIANÇAS BRASILEIRAS EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL TIAGO NEUENFELD MUNHOZ - UFPEL / FURG, JÚLIA BOANOVA BÖHM - FURG
Apresentação/Introdução Um conjunto de evidências internacionais indicou que adequadas condições socioeconômicas, de saúde materno-infantil e nutrição possibilitam pleno neurodesenvolvimento durante os períodos avaliados em diferentes contextos sociais e culturais (Rodriguez-Sibaja et al., 2020). No entanto, inequidades sociais, especialmente relacionadas a pobreza, tendem a apresentar um desafio importante ao adequado neurodesenvolvimento infantil. Os efeitos da pobreza no neurodesenvolvimento infantil foram observados em mais de 60 países, observando-se que inequidades socioeconômicas aumentaram o risco para atrasos no neurodesenvolvimento, sendo este risco maior entre os meninos do que entre as meninas (Victora et al., 2022). Evidências anteriores indicaram que as diferenças no neurodesenvolvimento infantil até os dois anos de idade são predominantemente explicadas por fatores socioeconômicos, como escolaridade e classe social (Villar et al., 2019). Desta forma, análise de trajetórias do neurodesenvolvimento infantil são fundamentais na tentativa de entender a complexidade do neurodesenvolvimento humano, especialmente entre crianças e famílias em situação de vulnerabilidade social. Neste tipo de análise, há possibilidade de investigar eventuais padrões de transição nas habilidades e dificuldades inerentes ao neurodesenvolvimento, buscando identificar trajetórias de neurodesenvolvimento, bem como identificar possível risco para uma trajetória de neurodesenvolvimento inadequada ou desfavorável.
Objetivos Avaliar as trajetórias de neurodesenvolvimento em crianças brasileiras que viviam em situação de vulnerabilidade social e eram beneficiárias de programas de transferência de renda durante o primeiro, segundo e terceiro ano de vida e descrever potenciais fatores associados a estas trajetórias.
Metodologia Uma análise longitudinal foi conduzida utilizando dados do estudo “Avaliação do Impacto do Programa Criança Feliz (PCF)” (Santos et al., 2020), por meio de um ensaio randomizado que incluiu 3.242 famílias de crianças durante o primeiro ano de vida que eram beneficiárias do programa nacional de transferência de renda (PBF: Programa Bolsa Família) (Campello & Neri, 2013). Trinta municípios brasileiros distribuídos em seis estados da federação (± 109 crianças por município em ± 5 municípios por estado) foram selecionados ponderando aqueles os quais aderiram ao Programa Criança Feliz (PCF) em 2016. Como critério, foram incluídos os municípios com população urbana ≥ 10 mil habitantes, com número de crianças ≤12 meses quatro vezes superior à capacidade instalada do PCF (visitas semanais à 80 crianças e suas famílias) e população maior ou igual a 800 crianças ≤12 meses beneficiárias do PBF. As famílias foram acompanhadas em visitas anuais presenciais nos anos de 2018 (T0), 2019 (T1) e 2021 (T3). Utilizou-se o Ages and Stages Questionnaire (ASQ-3) para avaliação do neurodesenvolvimento em cada entrevista presencial realizada. Para a atual análise, foram incluídas todas as crianças e famílias com informações disponíveis nas visitas presenciais e dados para os indicadores e desfecho avaliado, sem considerar a randomização do estudo original.
Resultados e discussão Foram analisadas informações de 2.249 crianças e identificadas três trajetórias de neurodesenvolvimento infantil, 80,5% das crianças apresentaram trajetória estável, 10,8% trajetória crescente, e 8,7% trajetória decrescente de neurodesenvolvimento. Estudos sobre as trajetórias de neurodesenvolvimento infantil são pouco frequentes na literatura internacional. No entanto, a prevalência de trajetória decrescente neste estudo (8,7%) foi similar com outros estudos internacionais. O baixo nível socioeconômico e escolaridade materna são frequentemente identificados na literatura como fatores de risco para inúmeros desfechos. No atual estudo, a prevalência de trajetória de neurodesenvolvimento decrescente foi cerca de 50% maior entre os filhos de mães com 0 a 4 anos de escolaridade em comparação com aquelas com escolaridade ≥ 9 anos de estudo, no entanto, os IC 95% incluíram as estimativas das demais categorias deste fator de risco e não permitem afirmar que existe associação no presente estudo. Contudo, como mencionado previamente, destaca-se que a literatura internacional indica que este fator está associado a menores escores de neurodesenvolvimento em crianças (Nilsen et al., 2020; Sania et al., 2019; Sudfeld et al., 2015).
Conclusões/Considerações finais Concluindo, observou-se que cerca de uma em cada 10 crianças apresentou trajetória de neurodesenvolvimento decrescente e nossos resultados apontam para potenciais fatores sociodemográficos, de saúde e parentalidade que podem predizer piores trajetórias de neurodesenvolvimento infantil, portanto, fornecendo evidências para a tomada de decisões e gestão do setor de saúde e assistência social.
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