Comunicação Oral

03/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO14.2 - Vulnerabilidades no contexto da Covid 19

46496 - SEXO, SOCIABILIDADE E COVID-19: VULNERABILIDADE E PRÁTICAS DE GESTÃO DE RISCO ENTRE HOMENS QUE FAZEM SEXO COM HOMENS ENTRE 2020 E 2022
THAMIRES DAYANE DE SÁ PEREIRA - UFPE, LUÍS FELIPE RIOS - UFPE, KARLA GALVÃO ADRIÃO - UFPE, INGRID VITORIA MACIEL - UFPE, RAYSSA KAROLLYNE DA SILVA - UFPE, JÉSSICA MAYRA UELLENDAHL RAMOS - UFPE, JÚLIO HENRIQUE LUCKWU - UFPE, GIOVANNA DE ALMEIDA CAMELO GOMES - UFPE, LARISSA VITÓRIA SILVA SOARES - UFPE


Apresentação/Introdução
Homens que fazem sexo com homens (HSH) são vulneráveis ao HIV/Aids, à violência e transtornos mentais, devido a processos de estigmatização relacionado à homossexualidade e transgeneridade, conforme a literatura especializada. O trabalho discute as vivências sexuais de jovens HSH durante a pandemia de Covid-19. Utilizamos uma abordagem construcionista da sexualidade, e considerou aspectos sociais, subjetivos e programáticos da vulnerabilidade aos agravos, como discutido por José Ricardo Ayres, Richard Parker e Vera Paiva.

Objetivos
O trabalho busca descrever como jovens HSH da Região Metropolitana do Recife (RMR) vivenciaram as vulnerabilidades e formas de proteção à pandemia de Sars-Cov-2, entre 2020 e 2022.

Metodologia
Os dados advêm de uma pesquisa etnográfica, iniciada em 2022 e em andamento, envolvendo observação participante, entrevistas com informantes chaves e com jovens HSH. Neste trabalho discutimos uma primeira análise exploratória descritiva dos dados, concernente a 17 entrevistas com jovens e 8 entrevistas com profissionais de serviços públicos de saúde e de segurança. Utilizamos análise temática de conteúdo, com foco nas preocupações dos profissionais em relação à vulnerabilidade dos HSH às epidemias de HIV e Sars-Cov-2; e aos modos como os jovens vivenciaram a epidemia de Covid-19. Também buscamos pelas medidas alternativas às propostas pela saúde pública, que utilizaram para ter sexo e socializar com amigos, garantindo, ainda que de forma ineficaz, o sentimento de segurança.

Resultados e discussão
Os profissionais entrevistados atuam com uma população pobre, que teve a maior dificuldade de atender às orientações biomédicas por fatores econômicos. Durante o período mais crítico da Covid-19 as preocupações dos profissionais estiveram relacionadas à nova pandemia. As mais citadas foram: a) dificuldades dos HSHs no isolamento devido ao estigma nas famílias, em alguns casos resultando em violência; b) HSHs em situação de rua e os que praticavam prostituição não tinham recursos para manter os cuidados necessários e isolamento; c) muitos não possuíam documentação suficiente para acessar programas sociais; d) aumento de transtornos mentais decorrentes das situações supracitadas, diante da iminência da morte e do estado de alerta provocado pela Covid-19; e) dificuldades com os cuidados necessários já que muitos frequentavam festas privadas e ou clandestinas. No que se refere aos jovens HSH, pessoas vivendo com HIV (PVH), destacaram que embora PVH fosse grupo prioritário, houve uma resistência à vacinação, por medo de serem identificados como "aidéticos" (sic.) e sofressem discriminação.
O relato dos jovens entrevistados, a maioria de classe média e remediada, apresenta preocupação com o vírus, proteção de si mesmos e das famílias. Salvo exceções, os jovens se mantiveram isolados, sobretudo nos primeiros meses da pandemia e período de lockdown. Aqueles que moravam com pessoas com maior vulnerabilidade à Covid-19 evitaram sair, para socializar com amigos, para festas ou para sexo, mesmo durante a reabertura. Ainda que o sexo não seja considerado um meio de transmissão, as interações sexuais podem se tornar ambiência para a infecção de vírus respiratórios. Como medidas de proteção, alguns jovens relataram engatar namoro, ou apenas transar com namorado, ou conhecidos. Houve quem “fechasse” relação não monogâmica até a vacinação. Alguns namorados residentes em casas diferentes passaram os momentos mais críticos interagindo pela Internet. Para os solteiros, os aplicativos de buscas de parceiros foram usados para combinar sexo online e também offline. A grande maioria, tanto dos que estavam em parcerias fixas como casuais, voltou a transar presencialmente em momentos de flexibilização e reabertura, antes da primeira dose da vacina. Com a primeira dose, relatam que a vida foi retornando ao “normal”.

Conclusões/Considerações finais
Identificamos a importância das condições econômicas nas condições de saúde dos HSHs, com implicações na vulnerabilidade a Covid-19 e transtornos mentais. Nesse contexto, o estigma da homossexualidade e de ser pessoas vivendo com HIV, entram em sinergia com o medo da Covid-19, impactando ainda mais as condições de saúde mental. Para muitos jovens não foi fácil conviver por vários meses com familiares que não sabiam de suas orientações sexuais, com medo de serem expulsos de casa e querendo socializar com amigos e transar. Conhecer o hábito das pessoas para tomar decisões sobre encontros com amigos e com parceiros sexuais se assemelhava às práticas soroadaptativas ao HIV/Aids (práticas preventivas alternativas às da saúde pública, a partir de sorologia presumida), descritas na literatura, em que vínculos e emoções mediam as interações sexuais desprotegidas. A pesquisa segue com a coleta e análise dos dados, aprofundando especialmente a análise das determinações de classe/renda, gênero (masculino ou efeminado) e raça nas vivências de estigma e sofrimento psíquico durante a pandemia, e nas práticas soroadaptativas ao Sars-Cov-2.