Comunicação Oral

03/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO16.7 - Diversidade de trajetórias, percepções e necessidade em saúde

46364 - MATERNIDADE NA ADOLESCÊNCIA, REDES SOCIAIS E TRANSIÇÃO PARA A VIDA ADULTA: REFLEXÕES A PARTIR DA TRAJETÓRIA ONLINE DE UMA JOVEM MÃE
SIMONE RAFAELA VEDANA LAZARI - FSP-USP, ANA CAROLINA FURLAN GONÇALVES - FSP-USP, CRISTIANE DA SILVA CABRAL - FSP-USP


Apresentação/Introdução
A transição para a vida adulta é um processo não linear, marcado por incertezas e especificidades contextuais e individuais. Na contemporaneidade, esse processo vai adquirindo características típicas de nosso tempo presente, sendo uma delas o uso frequente que os jovens fazem das redes sociais e outras tecnologias de informação e comunicação (TIC). A internet está incorporada no cotidiano de grande parte destes adolescentes e jovens, sobretudo daqueles moradores de contextos urbanos, que experimentam inúmeras relações sociais mediadas por um contínuo virtual/presencial. A reprodução e o trabalho são dimensões consideradas centrais no processo de transição para a vida adulta (Pais, 1993), mesmo que não aconteçam em etapas da vida consideradas adequadas. A partir da observação dos perfis de redes sociais de uma mãe adolescente, percebemos como o processo de digitalização do cotidiano (Lupton, 2015) se relaciona com seu processo de transição para a vida adulta, tendo em vista que é a partir das redes sociais que essa jovem mãe compartilha sobre seu maternar e entra no mercado de trabalho, a partir do marketing digital.

Objetivos
Refletir sobre o processo de transição para a vida adulta, sobretudo no que concerne as dimensões do trabalho e da reprodução juvenil, e suas modulações contemporâneas a partir da digitalização do cotidiano.

Metodologia
Este é um estudo de inspiração etnográfica, com observação e registro sistemáticos das atividades nas redes sociais de uma jovem mãe, atualmente considerada uma influenciadora digital. As redes sociais e a descrição das interações que ali se processam permitem apreender as conexões, as dinâmicas e as relações sociais que ocorrem neste espaço e que transbordam para o mundo “não-digital”. Observamos como uma jovem que se tornou mãe durante a adolescência se apropriou do compartilhamento de seu maternar e de sua atuação nas redes sociais em seu processo de transição para a vida adulta. A trajetória dessa jovem é um exemplo da não linearidade nesses processos de transição: ao se tornar mãe em uma idade considerada precoce e fora do ideal, ela se volta às redes sociais a fim de formar uma rede de apoio e acaba as utilizando como uma ferramenta para adquirir autonomia e independência financeira. Consideramos que o estudo dessa biografia nos permite entender possíveis estratégias contemporâneas de autonomização juvenil e como o uso das redes sociais é incorporado em processos de transição para a vida adulta.

Resultados e discussão
A jovem acompanhada atualmente tem 18 anos de idade, é branca e cisgênera, brasileira oriunda do sul do país, que engravidou aos 14 anos e foi mãe aos 15. Ela iniciou sua jornada na internet relatando a experiência da sua gestação e, posteriormente, sua vivência como mãe. A partir do compartilhamento de sua biografia na internet, principalmente nas plataformas YouTube e Instagram e, posteriormente, TikTok, a jovem conquistou um amplo público e chegou ao status de digital influencer. A necessidade de ter recursos financeiros para o sustento de si e de sua filha e o crescente alcance de suas postagens foram fatores que fizeram com que ela monetizasse sua atuação na internet, transformando as redes sociais em sua ferramenta de trabalho. Sua atuação nas redes sociais e o compartilhar de sua experiência de gravidez e maternidade na adolescência tinha por objetivo “desmistificar” este fenômeno e montar uma rede de apoio para outras “adolescentes mães”. Não tardou para que a jovem percebesse a potencialidade das redes sociais e a possibilidade de transformar a interação com seus seguidores em uma fonte de renda a partir da venda de infoprodutos. Ela afirma em suas postagens que trabalhar nesse ramo lhe proporcionou liberdade, tempo e autonomia financeira para cuidar de sua filha. A sua trajetória não se conforma às expectativas hegemônicas sobre reprodução e maternidade, o que exigiu uma reformulação de seus planos e a busca por estratégias de autonomia e independência financeira. O uso instrumental das redes sociais se configura como a forma que a jovem mãe ingressa no mercado de trabalho e constrói seu processo de transição para a vida adulta.

Conclusões/Considerações finais
O intenso uso de redes sociais e das TIC com finalidade de estabelecer redes de sociabilidade e apoio, compartilhar experiências sobre gravidez e maternidade e ingressar no mercado de trabalho indica uma relação entre os processos de digitalização do cotidiano e de transição para a vida adulta de jovens da contemporaneidade, já que esses dois elementos – reprodução e trabalho – ainda são fatores determinantes do tornar-se adulto. A existência de um contínuo on/offline retroalimentador permite que a construção de si que acontece nas redes sociais também aconteça no circuito presencial; no caso da jovem estudada, sua trajetória na internet permitiu com que ela adquirisse autonomia social e financeira, apesar do estigma que cerca a maternidade na adolescência.