Comunicação Oral

03/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO17.3 - Infâncias e adolescências sob violências - reflexões interseccionais e possibilidades de enfrentamento

45940 - PRÁTICAS PSICOLÓGICAS NA CLÍNICA INFANTIL COM FOCO DECOLONIAL
ALINE PAULINO TEIXEIRA - UNEB/BA -CAMPUS VI CAETITÉ, FAUSTA PORTO COUTO - UNEB/BA (PROFA. DRA.- DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO CAMPUS XII GUANAMBI )


Contextualização
Conceituado a partir de pesquisas de Tavares e Kuratani (2019) e Pinheiro (2023), o racismo é um problema social criado pelo ocidente, com a ideia de hierarquizar, trazer diferenciações e domínio de um povo em relação a outro. É importante entendermos como aprendemos sobre as questões que nos cercam, como ensinamos estes pontos para as pessoas e como as nossas vivências afetam, principalmente, as crianças. Fazendo um recorte no âmbito das questões raciais, o que se observa é a negação do racismo a partir do mito da democracia racial (DOMINGUES, 2005), invisibilizando a identidade e exercendo violência sobre o corpo da pessoa negra.

Nas práticas psicológicas, nota-se o quanto os sintomas coloniais, estruturados no conceito de raça, considerando o branco superior ao negro, interferem no manejo clínico (NOBEL, 2009). Parafraseando Nogueira (2021), a psicologia tradicional de origem europeia e estadunidense não dá conta plenamente dos processos psicológicos da população, principalmente quando se trata de questões raciais.
Na clínica infanto-juvenil tal olhar segue a mesma direção. Estudos apontam que as crianças negras podem sentir o impacto do racismo precocemente (DIAS et al., 2022; SANTANA et al., 2021). Assim, cabe a seguinte reflexão: “como o pensamento decolonial pode contribuir com as práticas psicológicas no atendimento infantil”?


Descrição
Foram realizadas sessões semanais, individuais, em consultório e com duração de 50 minutos para cada paciente. A condução dos casos seguiu a abordagem da Terapia Cognitivo Comportamental (BECK, 2022). Para assegurar as exigências éticas de sigilo o estudo utilizará somente classificações impessoais de identificação (caso A e B).

O Caso A trata-se de uma criança com 8 anos de idade, negra de pele clara, cuja família não se identificava como negra. Foram realizados 40 atendimentos, sendo que o recorte racial surgiu através na 15° sessão. Ao ser realizado o jogo “cara a cara”, a criança perguntou se o boneco era um “homem de cor”, mencionando que a cor do homem era parecida com a da psicóloga. No decorrer da sessão, a criança informou que ela não era daquele jeito e que ninguém da família era daquela forma.

Já o Caso B refere-se a uma criança de 9 anos de idade. Foram realizadas 32 sessões. B é uma criança branca que começou a trazer confrontos com uma colega da escola que era preta retinta e com cabelo crespo. Em uma discussão com esta colega, a criança relatou que detestava a menina por que ela tinha o cabelo duro e era diferente das outras meninas da escola.

Convém ressaltar que em ambos os casos foram realizadas intervenções com a família, criança e com a escola.


Período de Realização
O recorte para o estudo se refere aos atendimentos realizados em 2022 e 2023.


Objetivos
Refletir como o pensamento decolonial pode contribuir nas práticas psicológicas no atendimento infantil.


Resultados
Os dados encontrados corroboram com as pesquisas de Carneiro (2011), no sentido em que reafirmam a identidade étnico-racial como um fenômeno historicamente construído/destruído, sendo o período de escravização um fator de manipulação da identidade do negro de pele clara.

No caso A, as brincadeiras com foco étnico-racial, leituras da literatura afro-brasileira e orientação com os responsáveis foram fatores importantes para iniciar uma possível construção da identidade racial. Profissionais desatentos para estas questões podem contribuir com o apagamento da identidade e reforçar a ideia do racismo, por este motivo é necessário aprimoramento da sensibilidade cultural para terapeutas TCC (REIS, 2019).

No caso B, foi necessário entender sobre os incômodos sobre a colega, que perpassam pela a textura do cabelo e outros fenótipos. Trabalhamos a partir da orientação de pais (WEBER, 2019) e com as estratégias de treinamento das habilidades sociais (DEL PRETTE, 2005), tais como reconhecer e nomear as próprias emoções e as dos outros, demonstrar respeito às diferenças e resolução de problemas.



Aprendizados
Pensar nas práticas psicológicas antirracistas, com foco nos ambientes nos quais as crianças estão inseridas, pode ser um fator de proteção em relação aos impactos do racismo. A família é o primeiro convívio da criança, que passa, em seguida, à convivência nas instituições. Cavalleiro (1998), Gomes (2002) e Ferreira (2012) já evidenciaram a importância da escola como formadora de saberes escolares, sociais e culturais.

Análise Crítica
Com base nas referências, é possível entender o quanto o racismo pode contribuir com o sofrimento mental da população negra, podendo ser percebido precocemente e, através disso, é possível propor intervenções efetivas. Por este motivo, é necessário que profissionais se instrumentalizem, voltados à prática da clínica decolonial, com um olhar culturalmente sensível para as questões raciais. É indispensável que todos os envolvidos na formação da criança estejam voltados para “conectar a negritude enquanto potência e não enquanto tragédia” (RODA VIVA, 2020)