Comunicação Oral

03/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO20.4 - Políticas da reprodução: agência, ativismos e resistências

46688 - CORPO, UM TERRITÓRIO DE REPARAÇÃO: A EXPERIÊNCIA DE MULHERES INDÍGENAS NA SAÚDE SEXUAL E REPRODUTIVA
DANIELLE ICHIKURA OLIVEIRA - FSP/USP, MAIARA DAMASCENO DA SILVA SANTANA - UFBA, MARIA PAULA PRATES - UCL/LONDON


Apresentação/Introdução
Apresentamos neste resumo um excerto de resultados de uma pesquisa realizada entre outubro a dezembro de 2022, trabalho que abrange o levantamento de políticas públicas voltadas à justiça reprodutiva e saúde sexual de indígenas adultas e jovens no Brasil, bem como dados qualitativos e etnográficos oriundos de contextos socioculturais que testemunham sucessos, desafios e demandas relacionadas à implementações e efetivação de ações e programas governamentais. Decorrente de uma proposição do Centro de Culturas Indígenas del Perú (CHIRAPAQ), este projeto situa-se como parte de um estudo mais amplo que contempla, além do Brasil, os países do Perú, da Argentina, da Guatemala e do México. Configura-se como uma ação orquestrada de levantamento de políticas públicas de saúde sexual e reprodutiva, que tenham como foco indígenas jovens, adultas e idosas. Há nessa proposição um esforço na tentativa de proporcionar o recuo no tempo e nas injustiças perpetuadas ao longo dos séculos de colonização. Quantas mulheres indígenas perderam seus filhos e suas experiências de maternagem para a violência em seus territórios? Muitas das injustiças sofridas por mulheres indígenas desde muitos séculos seguem a ocorrer, e esta investigação coletiva buscou localizar o contexto atual brasileiro, identificar desafios e os caminhos possíveis no que se refere a atuação da Saúde Pública no país.

Objetivos
Através de diálogos realizados com mulheres indígenas, adultas e jovens, sobre suas experiências a respeito do acesso e a atenção à saúde sexual e reprodutiva, buscamos conhecer os desafios pertinentes ao campo da Saúde Pública identificando desigualdades nos resultados de implementação e de acesso a programas de atenção à saúde, no âmbito da justiça reprodutiva, experienciados por elas.


Metodologia
Realizamos a coleta de dados qualitativos etnográficos através de entrevistas semiestruturadas, em novembro de 2022, em cinco regiões do Brasil que abarcam seis diferentes contextos indígenas. Região Amazônica do Oiapoque, Estado do Amapá; . Região Amazônica de Ji-Paraná, Estado de Rondônia; Território Indígena Mehinako no Xingu, Estado do Mato Grosso; .Territórios Indígenas, Estado da Bahia; Territórios indígenas Guarani-Mbya, Estados de São Paulo e Rio Grande do Sul; Territórios indígenas Pankararu em São Paulo.

Resultados e discussão
O tema saúde sexual e reprodutiva engloba uma variedade de tópicos, de modo que o que está aqui registrado é o que emergiu como “problema” para as interlocutoras indígenas, embora tenhamos elaborado um roteiro aberto de entrevistas. A busca por acesso a informações sobre métodos contraceptivos, dúvidas referente a procedimentos como a laqueadura (e suas consequências a nível cultural) e limitação no acesso aos serviços básicos de saúde sexual e reprodutiva, como exames ginecológicos são exemplos que surgiram na maioria dos territórios analisados.
No que se refere a justiça reprodutiva, diversas questões surgem durante o processo de pesquisa. O que se passa quando as mulheres não querem engravidar? Quais são os métodos anticoncepcionais disponíveis? A restrição de acesso aos territórios ancestrais ou mesmo a destruição que muitos deles vem sofrendo por conta do extrativismo e monoculturas do agronegócio têm impactado as tecnologias de cuidado, anticoncepção e abortos de indígenas mulheres? Numa outra direção, que apareceu nas interlocuções com mulheres das regiões do Oiapoque e da Bahia estão temas como o da contracepção. Entre as mulheres Karipuna, Galibi Marworno e Palikur há uma procura significativa para realização de laqueadura. Entre indígenas Guarani-Mbyá e Mehinako isso não apareceu, bem como entre as Pankararu. Entre as indígenas Pataxó e Tupinambá algumas relataram terem recorrido à laqueadura pois não gostariam mais de engravidar, mas também relataram a ocorrência de laqueaduras sem consentimento nos corpos de indígenas. Algumas indígenas relataram o desejo de realizar o procedimento de laqueadura, mas até o momento da entrevista não haviam realizado devido à objeção dos seus companheiros.


Conclusões/Considerações finais
É fundamental garantir o acesso a serviços de saúde de qualidade e a participação ativa das mulheres indígenas nas decisões relacionadas à sua saúde. Para isso, é essencial implementar a inserção delas em espaços de poder e decisão no âmbito da saúde, além do planejamento de medidas que contemplem suas necessidades específicas, culturais e geográficas. É importante destacar a importância de incluir informações sobre dispositivos disponíveis nos serviços de saúde pública, caso se interessem, mas também para as equipes biomédicas no que concerne aos entendimentos indígenas de saúde sexual e ciclo de vida da mulher. Trata-se de movimentos a serem compostos a fim de beneficiar as indígenas, tornando-se e fortalecendo-as como agentes de seus cuidados e tecnologias de cuidado.