03/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO24.4 - Conhecimentos, epistemologias e cosmologia Afrocentrada |
46884 - EXISTE FORMAÇÃO HUMANIZADA E ACESSO À SAÚDE SEM A GARANTIA DE EQUIDADE ÀS MINORIAS NO ENSINO MÉDICO? EXPERIÊNCIAS E REFLEXÕES JULIANA FIGUEIREDO SOBEL - FACULDADE DE MEDICINA DE OLINDA, ANA PAULA ROCHA DA COSTA - FACULDADE DE MEDICINA DE OLINDA, ANDRESSA JOYCE PEREIRA BISPO - FACULDADE DE MEDICINA DE OLINDA, LORENA CORDEIRO DE ALMEIDA - FACULDADE DE MEDICINA DE OLINDA, OLÁVIO CAMPOS JÚNIOR - FACULDADE DE MEDICINA DE OLINDA
Contextualização A medicina ocidental moderna é marcada pela exclusão das minorias sociais no Brasil, sendo um agente de imposição do conhecimento ocidental em detrimento do indígena, além de corroborar com a manutenção de práticas racistas. Além disso, a ausência de educação sexual e discussões sobre identidade de gênero geram discriminação e estigmatização. Esses fatores causam vulnerabilidade e desigualdade social, maior prevalência de doenças, menor acesso a serviços de saúde e diagnósticos e tratamentos inadequados.
Descrição Esse relato baseia-se em experiências nas unidades curriculares (UC’s) de endocrinologia, dermatologia, saúde da mulher, do adulto e do idoso, do curso de medicina de uma instituição de ensino superior (IES) particular. As circunstâncias ocorreram em ambientes diferentes de acordo com a UC. As unidades teóricas Team Based Learning (TBL) foram vivenciadas em salas de aula com docentes especialistas em cada área, enquanto no Laboratório Morfofuncional (LMF), equipados com modelos anatômicos, os estudantes aprendem anatomia, radiologia e patologia. Já nas estratégias de simulação são discutidos e praticados casos clínicos em simuladores de pacientes humanos. Por fim, os atendimentos ambulatoriais na clínica escola, os estudantes atendem sob supervisão dos profissionais das diversas especialidades.
Período de Realização As experiências aconteceram durante o 4º ano do curso médico entre 01/08/2022 e 15/06/2023.
Objetivos Refletir sobre a ausência de representatividade das minorias sociais na grade curricular do curso de medicina de uma IES através da experiência de acadêmicas do quarto ano.
Resultados Após vivenciar o ensino básico e vivenciando o ciclo profissional, observou-se a iniquidade no voltado para o cuidado das populações LGBTQIA+, negra e indígena. Nos laboratórios, a maioria das peças anatômicas são de pele branca e na maioria das UC’s não foram discutidos conteúdos que perpassam a diversidade, nem as singularidades da população indígena. Nos ambulatórios, a maioria dos atendimentos são de pessoas pardas/negras, bem como há uma prevalência de pessoas cis gêneros heterossexuais. Dentre as lacunas existentes no ensino, destacam-se a capacitação e atendimento qualificados para mulheres e homens trans nas UCs de endocrinologia, ginecologia e obstetrícia. Ausência de ensino de particularidades, prevalência de doenças e formas de cuidado voltadas para a pele negra na dermatologia. E por fim, ausência de políticas de acesso e permanência da população trans, não binárias e afins, como a de Nome Social, em IES. Nota-se a carência de conteúdo singular sobre a saúde dessas populações, determinantes sociais, perfil epidemiológico das doenças, semiologia e as condições farmacológicas dos principais acometimentos no binômio saúde-doença.
Aprendizados A partir das UC’s em questão, percebeu-se um currículo com foco eurocêntrico e étnico branco, não-indígena, heterossexual, cisgênero e de classe média, e sendo este o ensino dos futuros profissionais da saúde. Foram percebidas lacunas na formação, como dúvidas em dermatologia sobre o cuidado das lesões em pele preta e a necessidade do ensino da terapêutica e eficácia para as diferentes populações. O próprio nome da UC de Saúde da Mulher não é inclusivo por não abordar a assistência de pessoas LGBTQIA+ dentro da ginecologia e obstetrícia, além disso o campo da endocrinologia também carece de especialização médica para atendimento à esses grupos no ambulatório. Sendo assim, fica evidente a escassez de conteúdo e discussões voltadas para questões de gênero, diversidade sexual e étnica, resultando em uma formação médica superficial e ineficiente para lidar com esses grupos, prejudicando a qualidade do atendimento prestado e, por consequência, o acesso à saúde. Portanto o óbice para o aprendizado integral precisa ser superado diante da necessidade de complementar o ensino médico para englobar uma saúde para todos, todas e todes.
Análise Crítica É necessário um esforço contínuo para desconstruir sistemas de poder opressivos e culturas discriminatórias para promover uma abordagem mais inclusiva na formação médica. Para tal, necessita-se a implementação de currículos culturalmente sensíveis, a promoção da diversidade e representatividade nas IES e criação de espaços seguros para discussões sobre temáticas de identidade e de justiça social. Além disso, é preciso romper com a expectativa da saúde universal, a universalidade perde o sentido quando estamos diante das desigualdades sociais e da pluralidade de sujeitos. É preciso pensar: o que é saúde para a população negra, indígena, LGBTQIA+? O que as faz adoecer? O que as mata e o que as faz viver? E, portanto, para a construção de uma equidade e de uma formação de fato humanizadora, faz-se necessário refletir e construir um cuidado emancipador para essas populações. Somente ao abordar ativamente esses temas pode-se construir um sistema de saúde mais justo, humanizado e digno para todos, todas e todes.
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