Comunicação Oral

03/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO24.4 - Conhecimentos, epistemologias e cosmologia Afrocentrada

47956 - PROJETO SANZALA DIA NZAMBI: OS MÚLTIPLOS SENTIDOS DE UM CURSO DE LETRAMENTO RACIAL PARA ESTUDANTES NEGROS DA USP
JENIFER DANIELE DE LIMA SANTOS - USP, ELIZABETE FRANCO CRUZ - USP, ADRIANA ALVES - USP, CELSO EDUARDO LINS DE OLIVEIRA - USP


Apresentação/Introdução
Ações afirmativas são políticas e programas de reconhecimento de direitos, devido às assimetrias sociais de origem histórica no Brasil, que resultam em desigualdade de acesso à educação, saúde, trabalho, moradia, dentre outros direitos. Na educação, a Lei de Cotas (2012) foi um marco na busca pela reparação histórica de um país marcado pelo racismo, mas apesar de seu histórico de mobilização negra, a Universidade de São Paulo (USP) foi a última universidade pública a adotar essa política, responsável pelo aumento na proporção de estudantes de negros de 11% em 2007 para 25,7% em 2019.
É inegável que só a ampliação de vagas não resolve todas as questões raciais. Neste sentido, a permanência estudantil e a construção de uma educação antirracista perpassam também por estratégias de auxílio financeiro, suporte educacional e emocional e redes de apoio para o fortalecimento dos(as) estudantes negros(as), reconhecendo os impactos do racismo na saúde mental dos estudantes.
Tendo em vista o aumento no ingresso de estudantes negros na USP, aliado à perspectiva de que a universidade pode e deve ser um espaço para trazer à pauta discussões sociais, o Projeto Sanzala Dia Nzambi, financiado pelo edital Pró Reitoria de Extensão Desenvolvimento Sustentável ODS 2030 da ONU de Redução das Desigualdades se propôs a contribuir para o letramento racial crítico dos estudantes da USP através da organização de um curso com essa temática para estudantes autodeclarados pretos ou pardos. O curso contou com 9 encontros, organizados em três módulos, com os seguintes temas: 1) Panorama das questões raciais no Brasil; 2) A experiência subjetivo de ser negro(a) e saúde emocional; 3) Movimentos estudantis negros na universidade.

Objetivos
Objetivo Geral: Conhecer e descrever os múltiplos sentidos do curso de letramento racial para os estudantes negros(as) da USP.
Objetivos específicos: Compreender a contribuição do curso para estratégias de enfrentamento ao racismo; Identificar como o letramento fortaleceu redes de apoio para estudantes negros na USP; Compreender os impactos do letramento nas questões raciais subjetivas e relacionais;

Metodologia
A metodologia utilizada foi a análise qualitativa de formulários avaliativos. Os participantes do curso foram convidados a colaborar com a pesquisa de modo voluntário, através de questionários online disponibilizados ao final de cada módulo, cujas respostas podiam ser feitas de modo anônimo. O projeto desta pesquisa foi avaliado e autorizado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da EACH-USP.

Resultados e discussão
Participaram da pesquisa 26 estudantes, sendo a maioria da graduação (52,9%). As respostas dos formulários foram sistematizadas nos seguintes eixos temáticos: Avaliação do curso; Percepção sobre o conhecimento adquirido; Lembranças e sensações suscitadas pela discussão; Compreensão da importância e necessidade de vias institucionais de enfrentamento ao racismo.
O curso foi avaliado positivamente por todos os participantes e alguns destacaram a importância de ser um espaço afrocentrado pela sensação de aquilombamento e pertencimento, mas houve o reconhecimento da necessidade de um curso voltado também para pessoas brancas. Sobre o conhecimento adquirido, para alguns participantes as discussões foram novas, enquanto para outros foi um aprofundamento do que já conheciam. O curso despertou o interesse de saber mais sobre os temas e trouxe à tona a ausência dessa temática nas disciplinas cursadas e na vivência universitária como um todo.
O impacto subjetivo do curso foi um dos aspectos mais comentados pelos participantes, sendo o principal tema das rodas de conversa de cada módulo. Houve identificação de situações de racismo vivenciadas dentro e fora da universidade e reconheceu-se o curso, em especial as rodas, como um espaço potente de refletir sobre a experiência de ser uma pessoa negra e se fortalecer. Foi destacada a necessidade de pensar a saúde mental da comunidade negra universitária. Por fim, os participantes reconheceram que o enfrentamento ao racismo na universidade possui três eixos principais: programas de permanência estudantil; coletivos e redes de apoio estudantis; e letramento racial da comunidade universitária.

Conclusões/Considerações finais
O Projeto Sanzala Dia Nzambi teve como principal foco pensar estratégias de acolhimento para estudantes negros(as) da USP e por isso tornou-se evidente a importância de munir os estudantes com o arcabouço teórico das relações raciais brasileiras para assim, tecerem bases sólidas para o enfrentamento do racismo dentro e fora da universidade e para fortalecer a comunidade negra da USP. Nota-se o impacto do racismo na saúde mental dos estudantes e a insuficiência de espaços de reflexão, escuta e acolhimento das questões raciais. Esperamos que essa pesquisa norteie ações semelhantes, a fim de construir uma educação verdadeiramente antirracista como aliada da promoção à saúde.