46360 - PANDEMIA E ESCOLA: AMPLIANDO EXPERIÊNCIAS DE ESCUTA DO SUJEITO RENATA MENDES GUIMARAES GEOFFROY - UFRRJ
Contextualização A partir da atuação enquanto psicóloga da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, objetivou-se descrever a experiência realizada em uma escola. É importante ressaltar que tal atuação é marcada pela psicanálise, na medida em que constitui minha formação.
A pandemia de Covid-19 que assolou o mundo em 2020 impôs o isolamento social e consequente fechamento das escolas para o ensino presencial durante quase um ano, havendo variações na reabertura das escolas no que concerne o âmbito público e privado. Após a reabertura das escolas, em 2021, há uma avalanche de pedidos de atendimentos a alunos com queixas de ansiedade, depressão, automutilação. Por se tratar de um momento histórico sem precedentes e de um fenômeno que atravessava a comunidade escolar de forma mais ampla, considerou-se a importância de um trabalho coletivo que favorecesse a emergência da singularidade dos sujeitos envolvidos..
Descrição Foram realizados encontros com adolescentes de uma escola pública do Rio de Janeiro.
Período de Realização 2021
Objetivos Propiciar um espaço de fala e escuta para os adolescentes no chão da escola.
Resultados Através dos encontros foi possível ter notícias do impacto da pandemia e das escolas fechadas: a dificuldade em assistir ou ter acesso às aulas remotas e aprender, a perda de familiares, a perda de sonhos. A maioria relatou não gostar muito das aulas online, pois não conseguiam aprender, preferindo as aulas presenciais, na escola. Afirmam a importância em poder falar e interagir com os colegas de uma outra forma: “(aqui) a gente fala o que realmente quer falar”, expressando a importância de espaços de fala e escuta na escola. Surpreendemo-nos, pois, quando paramos para escutar “esses sujeitos adolescentes” (ALBERTI, 1996): “A escola leva a outros lugares. A escola é lugar de estudar, amizade, esporte, educação, comida, lugar de pensar na vida, de não pensar nos problemas, escola significa futuro garantido, escola abre caminhos, significa pensar o que queremos no futuro, me faz ter disciplina. Eu me sinto bem quando estudo, na Educação Física, no treinamento, quando aprendo algo novo, porque é nosso futuro”. O relato de uma adolescente chama a atenção: “Eu sempre fui de pensar alto, mas depois desse ano fiquei desanimada, parei de acreditar em mim. Parece que tem um buraco na minha cabeça, tudo que entra sai pelo buraco”. Após este relato, uma professora se propõe a estar mais perto da adolescente e, após um tempo, nos conta que a aluna está pensando novamente no futuro, a começar pela escola que irá cursar o Ensino Médio.
Aprendizados Ao ofertarmos espaços de escuta na escola, constatamos a riqueza das discussões e reflexões travadas pelos alunos. Interessante ressaltar a forma como a pandemia e toda a situação social, política e econômica que se atravessava, vivida por todos ali, emergia em suas falas e a forma como isso incidia em cada sujeito. Além disso, em um tempo marcado por perdas de familiares e pessoas próximas, da imposição do isolamento social, entre tantas outras perdas foi possível perceber o lugar da escola na manutenção do desejo do sujeito e na aposta no futuro.
Faz-se fundamental também sublinhar a importância do professor: em nossa experiência, são inúmeros os exemplos de professores que assumem uma posição de querer saber mais sobre o mal-estar de seus alunos, estabelecendo importante vínculo. Ao pensarmos na escola como lugar de outros investimentos para os alunos, para além de suas famílias, vale ressaltar a escuta sensível com que professores se colocam próximos aos seus alunos, possibilitando que estes sujeitos coloquem questões, peçam ajuda, deem algum lugar para seus mal-estares. Lacan (1964/2003) define o termo escola: “ele deve ser tomado no sentido em que, em tempos antigos, significava certos lugares de refúgio, ou bases de operação contra o que já então se podia chamar de mal-estar na civilização” (p. 244).
Análise Crítica Podemos afirmar que a pandemia fez a sociedade olhar para a escola de um modo privilegiado, talvez próximo ao modo como aqueles que investem seu tempo e dedicação diariamente já sabem há tempos: que a escola tem uma função civilizatória fundamental; que a escola é lugar de outros investimentos para o sujeito adolescente – importante momento de desligamento da autoridade dos pais (FREUD, 1905/2016), ou seja, de estabelecimento do laço social para além da família, que coloca em cena a importância dos amigos e dos professores para o sujeito; a escola como parte integrante da rede de proteção da criança e do adolescente, o que implica que a escola é parte de uma rede. Assim, se testemunhamos um alargamento cada vez maior da escola e suas responsabilidades em relação ao aluno e ao território em que se insere, a escola só pode operar dentro e a partir de uma lógica intersetorial, pois a escola não existe e não resiste sozinha. Por outro lado, sabemos também como a escola enquanto política pública possui um acesso privilegiado às crianças, adolescentes e suas famílias: é um acesso diário de convivência e trocas. Nesse sentido, o presente trabalho ancorou-se na ideia da escola enquanto lugar de participação, buscando, portanto, ampliar as experiências de escuta da palavra dos sujeitos ali presentes.
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