03/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO32.6 - Decolonização dos saberes e práticas em Saúde Mental |
47018 - DESAFIOS PARA A INSTITUIÇÃO DA POLÍTICA ANTIMANICOMIAL DO PODER JUDICIÁRIO IARA VELOSO OLIVEIRA FIGUEIREDO - FIOCRUZ, JAMILLE MARIA RODRIGUES CARVALHO - FIOCRUZ
Apresentação/Introdução Os manicômios judiciários no Brasil apresentam um histórico de violações dos direitos humanos e de condições desumanas de tratamento. Ao longo do século XX, essas instituições funcionaram como prisões para pessoas com transtornos mentais que cometeram crimes, resultando em segregação, isolamento e repressão, com pouca atenção à saúde mental e reabilitação. Desde a Lei da reforma psiquiátrica Lei 10.216/01, vem ocorrendo a transformação do modelo assistencial psiquiátrico no Brasil com substituição do modelo asilar por modelos mais adequados de atendimento e tratamento. Medidas de segurança ambulatoriais e o fortalecimento da rede de saúde mental têm sido adotados como alternativas à internação prolongada. 22 anos depois da Lei da reforma psiquiátrica, o Poder Judiciário trás atenção para o que estão chamando de “Nova Política Antimanicomial do Poder Judiciário”. Resgatando os preceitos da desinstitucionalização e humanização do tratamento, com o objetivo de reinserção social dos indivíduos. Essas ações estão alinhadas com as diretrizes da nova política e buscam garantir os direitos das pessoas em custódia com transtorno mental ou deficiência psicossocial, evitando a permanência em hospitais judiciários e garantindo o atendimento adequado em hospitais gerais ou instituições de saúde referenciadas pela Rede de Atenção Psicossocial.
Objetivos Compreender os desafios para a instituição da política antimanicomial do poder judiciário na perspectiva da saúde pública
Metodologia Utilizou-se o método hipotético dedutivo amparado por uma revisão narrativa da política antimanicomial no judiciário, buscando-se caracterizar o estado da arte quanto ao conhecimento produzido sobre o tema com o objetivo de apresentar os desafios para a implantação da política no judiciário a partir da perspectiva da luta antimanicomial.
Resultados e discussão Foram encontradas algumas iniciativas no âmbito do poder judiciário no sentido da política antimanicomial no CNJ e Tribunais de Justiça de Minas Gerais, Goiás, Maranhão, Piauí e Pará. A principal delas foi a realização pelo Conselho CNJ, do Seminário Internacional de Saúde Mental em junho de 2023, que culminou com a Resolução do CNJ 487/2023 que pretende adequar a atuação do Judiciário às normas nacionais e internacionais de respeito aos direitos fundamentais das pessoas em sofrimento mental ou com deficiência psicossocial em conflito com a lei, visando fechar todos os Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, e transferir seus cerca de 3 mil presos a estabelecimentos da Rede de Apoio Psicossocial do SUS (RAPS). A Resolução CNJ nº 487/2023 representa um avanço nesse processo de mudança na assistência à saúde mental para pessoas em conflito com a lei.
Já o Conselho Federal de Medicina, a Associação Médica Brasileira e a Associação Brasileira de Psiquiatria, se colocaram em posição contrária à Resolução 487 do CNJ, com discursos alarmistas e contrários à desinstitucionalização.
Na perspectiva da saúde pública, o fim dos manicômios judiciários no Brasil apresenta desafios específicos. Os principais são: Desenvolvimento de alternativas de tratamento com investimento na expansão e qualificação da RAPS; Formação de profissionais de saúde para que estejam preparados para oferecer um tratamento adequado às pessoas em conflito com a lei que possuem transtornos mentais, para promover a reabilitação e a reinserção social desses indivíduos; Articulação entre saúde e justiça para garantir uma abordagem integral e integrada no tratamento de pessoas com transtornos mentais no sistema judiciário com estabelecimento de fluxos de trabalho colaborativos; Enfrentamento do estigma associado às doenças mentais, especialmente no contexto do sistema judiciário; e Monitoramento e avaliação para acompanhar a implementação das políticas de desinstitucionalização e garantir a qualidade e a efetividade dos serviços substitutivos.
Conclusões/Considerações finais A pesquisa identificou alguns dos desafios que a saúde pública enfrenta para acabar com os manicômios judiciários no Brasil. A superação desses desafios exige uma abordagem multidisciplinar, envolvendo políticas públicas, investimentos, parcerias entre os setores e uma mudança cultural em relação à saúde mental e ao sistema judiciário.
O nome hospital de custódia apresenta uma ideia de cuidado em saúde que nunca foi priorizado. É importante considerar que a saúde não deixa de existir quando entra em contato com o sistema de justiça. Os ‘manicômios judiciários’ são instituições que nem de longe aplicam os preceitos da reforma psiquiátrica. Não ressocializam e não cuidam dos indivíduos, reproduzem violência, discriminação, abuso e estigmatização. As recentes iniciativas do Poder Judiciário em direção a uma política antimanicomial devem ser vistas como um avanço tardio e com muitos desafios pela frente. Conclui-se pela necessidade de aproximar os profissionais do direito ao conhecimento da saúde pública para promoção de uma política antirracista e antimanicomial no judiciário.
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