Comunicação Oral

03/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO33.8 - Política de ST e Pecarização do Trabalho II

48258 - REVISITANDO CECÍLIA DONNANGELO E O MERCADO DE TRABALHO EM SAÚDE NA CONTEMPORANEIDADE: AUTONOMIA PROFISSIONAL, TRABALHO ASSALARIADO E “PRECARIADO”
RICARDO CARDOSO DOS SANTOS - ISC/UFBA, CATHARINA LEITE MATOS SOARES - ISC/UFBA


Apresentação/Introdução
Se o trabalho se dá como atividade mediada por uma finalidade através de instrumentos e operado sobre um objeto para a obtenção de um produto, o processo de trabalho em saúde se assenta na relação entre esses elementos. Isto é, o trabalho em saúde se dá por uma finalidade, é composto pelas necessidades de saúde, que são objeto de intervenção através de tecnologias como saberes, instrumentos materiais e relações entre sujeitos. Os agentes desse trabalho imprimem nesse processo a dinâmica do trabalho humano a sua época. Essas características conferem dinâmica específica para a integração de trabalhadores da saúde ao mercado de trabalho. Nessa compreensão, cabe considerar a formação social latino-americana e brasileira frente ao cenário internacional versus a formação de países de capitalismo avançado do Norte global. A estrutura social vigente no atual sistema capitalista periférico brasileiro, além das políticas macroeconômicas e a configuração do mercado de trabalho, associados às políticas de Trabalho e Educação na Saúde e aos meios de produção de serviços de saúde, repercutem na configuração do mercado de trabalho em saúde. Para a reflexão acerca desses elementos, Donnangelo, ao pesquisar a integração de médicos no mercado de trabalho na sua obra “Medicina e sociedade”, articula a autonomia profissional às características dessa integração.

Objetivos
Este trabalho objetiva articular as reflexões de Donnangelo quanto à integração de médicos ao mercado de trabalho brasileiro a aspectos relacionados à configuração do mercado de trabalho em saúde nos tempos atuais.

Metodologia
A construção da problemática neste ensaio se deu através da leitura da obra “Medicina e sociedade”(1975), associada a revisão bibliográfica de artigos, cuja busca se deu pela palavra-chave “mercado de trabalho em saúde”, e referenciais das Teorias Sociais, para o aprofundamento da compreensão da temática, especialmente em diálogo com novas epistemologias e abordagens decoloniais.

Resultados e discussão
Ao associar a integração de médicos ao mercado de trabalho na década de 1970 à configuração do mercado de trabalho em saúde em tempos seguintes, e, no Brasil, especialmente a partir de 1990, com a implementação do SUS -momento em que o trabalho em saúde vai se constituindo enquanto problemática central para o sistema, dada a sua importância na manutenção deste-, emergem categorias para análise. Destaca-se o perfil dos trabalhadores da saúde, a sua distribuição geográfica, características da formação profissional, inserção no setor público, privado ou filantrópico, vínculos, jornadas e relações de trabalho e renda. Dessas categorias, comuns ao estudo nas diferentes conjunturas, cabem ainda novas problemáticas, atreladas às características dos meios de produção e da produção em si dos serviços de saúde na conjuntura atual no espaço em análise. De 1990 em diante, então, pode-se situar um contexto político-econômico no Brasil de instabilidade, com padrão de desenvolvimento neoliberal, com desdobramentos representados através das privatizações, flexibilizações e desregulamentações. Nesse contexto, as relações de trabalho ficam cada vez mais marcadas pela informalidade, instabilidade, alta rotatividade de profissionais e precarização, além das más condições de trabalho, capazes, inclusive, de produzir violência, assédio, exploração, sobrecarga e adoecimento no contexto do trabalho em saúde -atrelando as condições de trabalho e de inserção no mercado de trabalho às condições de saúde (e saúde mental) dos trabalhadores. A divisão social/sexual do trabalho, verificada nas disparidades salariais e no acesso desigual a posições pelos diferentes gêneros, propõe a discussão acerca da feminização das profissões vs a proletarização feminina, associada a uma época em que os papéis atribuídos aos gêneros vão sendo continuamente tensionados. Outras interseções, como a étnico-racial, além da regionalidade, mostram relevância, seja pela compreensão do racismo estrutural/institucional e sua repercussão no acesso a diferentes postos de trabalho, como pelas diferenças produzidas no acesso aos serviços de saúde entre os grandes centros urbanos/capitais de outras regiões.

Conclusões/Considerações finais
Nesse contexto, de análise e reflexão do mercado de trabalho enquanto espaço de troca e articulação entre a produção e a distribuição de serviços, o setor saúde mostra suas especificidades, associadas à compreensão da saúde enquanto direito social, ao tempo em que também está marcado por características da estrutura política, econômica e ideológica dominante vigente. No mercado, o neoliberalismo vem deslocando a concorrência, mesmo na produção de serviços de saúde, para a competitividade, frente a atuação do Estado na sua regulação, em uma estrutura social capitalista. Esses entroncamentos reconfiguram a autonomia profissional, enquanto característica central das profissões de saúde, no caminho da sua perda progressiva, com um deslocamento do trabalhador assalariado para o trabalhador "precariado".