Comunicação Oral

02/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO7.2 - A (De) colonialidade na pesquisa em comunicação e saúde

46410 - PESQUISAR COM’: EXPERIMENTAÇÃO METODOLÓGICA NÃO EXTRATIVISTA EM BUSCA DA DESCOLONIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTOS
MARCIA RODRIGUES LISBOA - FIOCRUZ, INESITA SOARES DE ARAÚJO - FIOCRUZ, SILVIA BEZERRA SANTOS - FIOCRUZ, SANDRA RAQUEW DOS SANTOS AZEVEDO - UFPB


Apresentação/Introdução
Produzir conhecimento junto com as pessoas envolvidas na pesquisa, e não apenas tomá-las como “informantes”. Esta perspectiva epistemológica não extrativista, inspirada em premissas decoloniais do fazer científico e acadêmico, orientou a investigação “Pandemia e contextos criativos: cartografia de tecnologias e arranjos de informação e comunicação de populações negligenciadas para enfrentamento da Covid-19”, realizada entre 2021 em 2023, em cinco regiões metropolitanas brasileiras: Brasília, João Pessoa, Recife, Rio de Janeiro e Vitória. Para tanto, foram formados cinco núcleos, com pesquisadores, estudantes e bolsistas de três instituições públicas federais. O objetivo da pesquisa foi produzir conhecimento sobre tecnologias informacionais e comunicacionais de populações pobres no território brasileiro no contexto do enfrentamento da pandemia da covid-19. Neste trabalho nos deteremos no percurso metodológico, discutindo seu potencial decolonial.

Objetivos
Apresentar e discutir o potencial decolonial da metodologia desenvolvida na pesquisa.

Metodologia
Partimos do princípio de que todas as pessoas não só têm conhecimentos prévios importantes sobre temas que lhes dizem respeito, mas também podem refletir sobre esses conhecimentos, articulá-los a outros e assim produzir novos conhecimentos. Neste sentido todos os indivíduos são produtores de conhecimento, podendo receber o status, num sentido lato, de pesquisadores.
Sob a égide do descentramento analítico, que se concretiza na postura de pesquisar “com”, e não “sobre”, delineou-se a pergunta central da investigação: “No enfrentamento da Covid-19, que tecnologias comunicacionais populações negligenciadas das cidades e campo desenvolvem ou adaptam para a prevenção do contágio e quais as suas características?”
Principais métodos:
Cartografia: Foram analisadas 50 ações de comunicação, dez por núcleo, não vinculadas a meios de comunicação comerciais e a instituições de saúde. Para a seleção das iniciativas, consideraram-se a diversidade temática e tecnológica e a abrangência de área. Foram cartografadas estratégias e ações comunicacionais digitais e com ancoragem física no território em suas múltiplas dimensões.
Conversações: Promoveram-se sucessivas aproximações à realidade comunicacional das áreas periféricas, pelo ponto de vista de seus comunicadores, em rodadas de conversas com as equipes dos núcleos. Aproximadamente 80 comunicadores participaram pelo menos de uma roda de conversa, uma vez que várias iniciativas tiveram coordenação coletiva.


Resultados e discussão
A metodologia não eliminou o protagonismo dos pesquisadores dos núcleos, mas compartilhou esse protagonismo com os comunicadores. Se as definições já estavam inicialmente dadas, por exigência do Comitê de Ética, elas poderiam ser alteradas posteriormente, caso houvesse demanda. Os comunicadores tinham liberdade de incluir, alterar ou mesmo eliminar temas, perspectivas, influir na condução das conversações e, finalmente, validar ou não os resultados e conclusões que as equipes dos núcleos propunham como ponto de chegada, examinando o quanto correspondiam à sua percepção da realidade e ao que trouxeram nas conversações.
Esta foi a principal experimentação, no sentido da descolonização da pesquisa. O processo segue, neste momento, com a produção dos materiais de circulação dos resultados para os moradores das áreas cuja comunicação foi incluída no estudo, sobre a qual as decisões também serão compartilhadas.


Conclusões/Considerações finais
O aprofundamento da postura teórico-metodológica do “pesquisar com” indicaria a participação de todos os envolvidos desde a concepção do projeto, e não apenas como pesquisadores convidados. A exigência de os projetos só poderem se relacionar com as pessoas que não fazem parte da equipe de investigação após a liberação pelo comitê de ética, quando já está elaborado, representa um impedimento aos desígnios decoloniais. Mas esse empecilho começa nos editais, uma vez que nossa prática de pesquisa ainda requer recortes temáticos muito específicos. O recorte ignora a rede orgânica de articulações mutuamente constitutivas que ocorre na vida nos territórios.
Outra dificuldade sentida decorreu talvez do fato de a pesquisa ter sido feita de forma totalmente digital, o que acentuou o descompasso das temporalidades institucionais e dos comunicadores nos territórios. Assim, uma parte deles não pôde participar da validação e uma parte consistente não conseguiu estar presente no seminário de apresentação dos resultados.
Mesmo assim, consideramos que avançamos um pouco no sentido da descolonização da pesquisa e a participação ativa dos comunicadores na produção do conhecimento sobre sua própria realidade adensou e qualificou melhor o resultado final.