03/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO7.3 - De mães, avós e jornalistas. Reflexões (De) coloniais sobre a vida e a saúde |
46005 - CARTAS PARA MINHA AVÓ: REFLEXÕES SOBRE O CUIDADO EM SAÚDE A PARTIR DE UMA LENTE DECOLONIAL GLEICIELLY ZOPELARO BRAGA - UFF, MÔNICA DE REZENDE - UFF
Apresentação/Introdução De onde eu venho, no interior de Minas, é comum as meninas aprenderem bordar. De geração a geração, com orgulho, as mulheres mais velhas ensinam as mais novas fio a fio esse feitio. As linhas se entrelaçam formando desenhos, tessituras, colorindo o molde. Assim como em um bordado, a vida se conecta, passado e presente dialogam, logo, as histórias de vida se costuram, somam, e os caminhos são partilhados. Pensando nisso, esse trabalho ousa dialogar com Aline Pachamama, Ailton Krenak, e outras autoras quando invocam sua ancestralidade, contribuindo para reflexões decoloniais frente ao cuidado em saúde, ensino e aprendizagem acadêmicos.
Objetivos Esse diálogo tem como objetivo refletir sobre as práticas do cuidado que apesar do apagamento e da desvalorização do saber ancestral, resiste e é capaz de nos clarear horizontes
Metodologia A partir da narrativa em cartas em um tempo não cronológico, converso com minha avó, uma descendente do povo Puri da Zona da Mata Mineira, guardiã dos saberes e encantarias da floresta. Essa mulher, representante de um coletivo indígena que sofreu ou sofre apagamento é também aquela que me inspira força e resistência.
Resultados e discussão Assim como Luiz Antônio Simas e Luiz Rufino, me vejo em certos desassossegos ao pensar sobre o modelo de produção de conhecimento, que por vezes acaba por reduzir e descredibilizar experiências sociais, culturais, espirituais. Logo, a transgressão dos limites coloniais pode ser entendida como princípio ético, que rompe com o legado da colonialidade, em que é impossível a lógica de um formato único de cuidado, de saberes e de vida.
O assombro propagado e mantido durante gerações pelos opressores, forçaram às habilidades tradicionais a se esconderem, e mesmo enquanto anônimas, sussurraram seus dons, como vozes que ecoavam da sensibilidade e sabedoria.
A dedicação desse cuidado ancestral atua na contra mão da biomedicina, em que o trabalho fragmentado acaba por assumir as mazelas do corpo físico enquanto doenças a serem tratadas, deixando de lado o ser humano em toda sua complexidade, que transcende essa dimensão.
Em cartas para minha avó, invoco memórias de uma infância, mergulho nos rios de minhas lembranças, onde compreendo o motivo do cuidado que hoje, profissional do SUS, coloco em disputa e busco exercer. Quando me deparo com a dor da outra, ouço o ecoar dos ensinamentos dela, reverberando através de meus poros. Quando fecho os olhos, na calada da noite, ainda ouço suas palavras que bem dizem e agradecem às estrelas o dia que findou.
Tudo está conectado, fazemos parte de uma teia, e o cuidado com a outra também é me cuidar. Sarar a outra, também é me sarar. Ouvir a outra, também é me ouvir.
Partimos do pressuposto de que não existe futuro saudável se a formação dos profissionais em saúde não dialogar com a ancestralidade, pensada enquanto uma dimensão que interliga diferentes expressões e possibilidades de existência. A vida acontece para além das salas de consultórios de atendimentos, assim como a riqueza na aprendizagem se encontra para além dos muros universitários. É imprescindível romper com a reprodução dos moldes colonizadores onde o único mundo possível é esse, das classes dominantes, em que tudo se transforma em mercadoria... a educação, a saúde, o alimento, a água, a moradia, a cultura, o conhecimento, a dignidade, a natureza, a terra, as pessoas, as vidas.
Conclusões/Considerações finais Concluo, que esse estudo contribui na reflexão das práticas de cuidado que acontecem no cotidiano e no campo de ensino e aprendizagem, nos horizontalizando para a possibilidade de um diálogo que transborda os limites disciplinares, acolhendo as diversas faces do conhecimento, uma rede, teia, em que fio a fio os saberes, as encantarias, se conectam.
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